Ponho-me a reivindicar
Uma porção maior de vida,
Uma dose extra de existência,
Para transpor a fadiga
Que os seus olhos me impõem.
O vazio dos teus olhos
Não cansa a volúpia aristocrática,
Pois seus olhos sem destino
Iluminam a estrada
Calçada do sangue
De assassinatos pela soberania
E da fome
Dos que alimentam os saciados.
Teus olhos turvos
Imploraram pelo afago de casa
Mas seu lar...,
Nefasto ninho de cobras,
Oferece-te o veneno
Como leite.
Estes olhos frescos,
Regados pelo orvalho matutino,
Não pululam de regozijo
Ao nascer da estrela D’Alva.
Triste inicio de horizonte
Apenas o candelabro
Do precipício.
Terríveis olhos negros
Trocaste o meigo
Ao assassínio.
Vendeste por um denário
Teu amor e teu fascínio.
Estes olhos
Que presenciaram
E sucumbiram ao sacrifício
De todas as crianças
Não terão dó
De multiplicar
e potencializar a herança.
Estes olhos que não sei
Se são da vítima
Ou do vilão...
Porque todo escravo
Carrega a culpa
De enxergar-se como tal.
"A maior riqueza
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.
Palavras que me aceitam
como sou
— eu não aceito." Manoel de Barros