Encostado, entre quatro paredes,
um desgraçado, de um, de muitos
mendigos, que proliferam, infelizmente,
pelas nossas cidades,
comemorava a sua noite de natal,
a meio a luzes de néon e de carros,
o que alguém, de boa consciência,
lhe havia oferecido, na sua demanda
pelo dia de hoje, e que ele, com muito
cuidado, embrulhou, num lenço
colorido de pano, um tanto esgarçado.
Enquanto ia escolhendo, o que saborear
primeiro, meticulosamente, voltava a
fechar o pano, para a comida não
endurecer, e, seus olhos, brilhavam,
não sei se em agradecimento ainda, ou se
pelo efeito das luzes, engalanando ruas,
reflectindo nas suas pupilas, o que,
por meros momentos, a quem passava,
repugnância não causava, pois todo
esse brilho, juntando-se-lhe ao seu melhor
fato, humano, como os outros, se parecia.
Depois, de comer um pouco, de sua
consoada, guardou cuidadosamente o
restante, num canto, entre degraus, sua
casa, fazia muitos anos, e, resolveu-se a
sair para as ruas, propriamente ditas,
misturando-se com as pessoas e os muitos
sorrisos, próprios desta época, onde não
faltava gente, vestida de pai natal e enormes
árvores, todas coloridas ricamente,
deixando-o especado, sem saber muito bem,
como se comportar, embora a tudo sorrisse.
Habituado a nada ter, senão esforço desmedido
e muito sacrifício, sabia que tudo isso acabaria,
no dia de amanhã, tendo então de se conformar,
a voltar a percorrer, de novo, rua ante
rua, mas também, que, hoje, iria aproveitar,
até onde lhe fosse permitido, o natal dos outros.
E assim, sem causar distúrbios, passou horas,
ora vendo montras, enfeitadas, ora, a um canto,
encostando-se, tirando um pouco mais, do que
havia trazido, reservado, no bolso de seu casaco,
qual criança, deixando o melhor para o fim.
Jorge Humberto
2 3/12/08