Prosas Poéticas : 

"Paleta de Sombras"

 
Cansado de pintar a cor dos olhos…
Bloqueado, no imenso das mãos que cumprem, esganam a palidez do sorriso, navega o corpo destituído, mundo de olhares, cair…

De que cor são as minhas mãos?

Quase incestuoso, tantas imagens cercadas na cabeça, tantos lugares a luz apaga, tantas certezas da incerteza de criar ou ser criação de algo mais digno.

Olho para trás, ainda chove…

As paredes encerram as vidraças onde espreitam os olhares sem cor, foi mundo, as sombras avançam ocupando os territórios inocentes das minhas veias, somente o silêncio compõe esta melodia, a obra termina com um traço pálido de olhar.
Avanço lentamente, não sei para onde vou, tenho medo…
Que espectáculo da vida me enfurece, arruína, sacrilégio das mãos que moldam o sonho, cometi adultério com as palavras, mais uma vez…
Ergo castelos, surjo do nada para ser um todo, das mãos trémulas um grito arruína o silêncio que paredes de papel consomem, eram versos! Eram os meus pecados!

E volto ao espaço vazio desta alma, fico, uma comunhão de cores solta-se euforicamente, meu cérebro inocente atira verdades à palidez da moldura que se fez de tudo e de nada.

Olho para trás, ainda chove…

Fecho os olhos, misturas de estrelas num céu azul, são certamente estilhaços do sonho que não fui, certamente serão imagens quebradas na magia do ninguém que fui, do real que sou, ou talvez não seja nada, mas… O princípio do fim do meu imaginário.

Sou homem agora, convidado a desistir, não!!!...

Mergulhei e abracei mares nebulosos da memória, é cor que as mãos inventam, saliento, é dor que as mãos libertam.
Sou corpo, atirado às vagas de mar, sonho morto, destino apagado agora que chegam as chuvas para me levar.

Peço perdão por não olhar para trás, a alma serve-se perfeita às mãos dos céus.

À minha volta só lágrimas de chorar, um instinto diz-me, vai hoje o sol assassinar, ficam silêncios que sou eu, a minha alma, condenar.
A chuva na sua densidade faz obstruir os caminhos, minha vida, que ridículas palavras não têm qualquer sentido e são as minhas.
Que tudo o que vi com cor se desnudou para não ser.
E nada mais faz sentido agora, que cego se atordoa o caminho, que estes punhos de dor cerram com pedaços de tela desfeita, não sei porque me perdi nas cores, não sei porque se levantam os imaginários que não tive, não sei…
Não sei porque o faço mas é inevitável.

Nasci assim, que querem de mim?

Nasci assim para ser quem sou, nada me destitui da alegria de fazer o que a alma pede, negoceio apenas o dom da palavra, não pedi nada!
As paredes dão à luz o meu sangue que é cor verdadeira a enfeitar os meus mundos, um sangue que ferve amedrontado e rasga tortuosamente até ao mais fundo do ser, para entregar ao mundo, não seja apenas sonho, o mais sentido e profundo de uma alma nobre e diabolicamente sã.
Da minha boca, mistérios, são verbos de morte que vêem na minha loucura para me levar, para me ocultar.

Olho para trás, não existe nada…

Caio…

A chuva não vai acabar.

Paulo Themudo

www.paulothemudo.com

 
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Paulo Themudo
 
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Enviado por Tópico
Vera Sousa Silva
Publicado: 19/12/2008 09:15  Atualizado: 19/12/2008 09:15
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Mensagens: 4098
 Re: "Paleta de Sombras"
Uma excelente prosa Paulo. Lê-se e as palavras entranham-se-nos na alma...
Há frases muitíssimo marcantes e bastante introspectivas.
Gostei muito.

Beijo