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Circunstâncias Circunstanciais do Homem

 
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“Eu sou eu mais as minhas circunstâncias”. Recentemente, esta frase de ORTEGA y GASSET foi evocada numa conferência a que assisti.

Subordinada ao âmbito da cultura, a qual apesar de toda a sua amplitude não deixa de ser compartimentada, ou involuntariamente desviada, a ligação das circunstancias de hoje com as de outrora foi delineada. Através de um desenrolar de sucessivos elos, simultaneamente, o homem e as suas variadas manifestações culturais foram referidos.

Estas realizações culturais traduzem uma evolução que preenchem a esfera existencial do homem. Sem excepção, todos os campos de actuação humana – social, civil, político, económico, artístico, religioso, etc, – são abrangidos pelos «ismos» (capitalismo, socialismo, comunismo, cristianismo, islamismo, judaísmo, determinismo, impressionismo, etc).

Pode não ser linear e/ou consensual desde os primórdios da existência dos nossos antepassados primatas, porém, é inquestionável que, a partir de um determinado momento, o homem foi gerador das circunstâncias. O Estado, moldado num processo gregário, é uma dessas ocorrências. E chegados a este ponto, é crucial notar que essa agregação é fundamentada pelo preenchimento de um vazio que levou a soma dos indivíduos a procurar esse tipo de associação.

Ora, as eventualidades que nos fazem resultam das que fizeram os que nos antecederam. Não são necessariamente as mesmas mas representam as sucessivas camadas onde assenta o desenvolvimento do homem e o alargar do seu horizonte cultural.

Por isso somos! Circunstancialmente também! Mas o que hoje somos, somos, na minha opinião, devido à escolha feita por Leónidas e pelos outros duzentos e noventa e nove espartanos. Escolha de verdadeiro carácter. Escolha que não foi fácil. Afinal, se já eram sombrias as circunstancias que os levaram às Termópilas, o ambiente que lá vivenciaram foi muito mais profundo e final.

E opções como as acima descritas dificilmente são tomadas pelos nossos líderes políticos. Donde, no limite, resulta que o Estado não procura efectivar os fins que fizeram a sua origem. Por outras palavras, o Estado é uma criação do homem que não visa o bem-estar do seu criador mas sim a sua própria sobrevivência e manutenção.

A relatividade não é apenas aplicada ao binómio espaço-tempo. É incomensuravelmente percepcionada no todo e em tudo que nos rodeia. É particularmente sentida no intangível das circunstâncias, onde a soma do individual não perfaz o resultado da sociedade.

Como tal, o Estado não é imprescindível e/ou insubstituível. É o imutável mutável através das circunstâncias e dos momentos. Se não for capaz de suprir o vazio entre si e a soma dos indivíduos que o compõem sucumbirá. A bem ou a mal.

ORTEGA y GASSET também disse: “Eis o que leva ao intervencionismo do Estado: o povo converte-se em carne e massa que alimenta o simples artefacto e máquina que é o Estado”.

Eu? Apenas, tal como o poeta, digo: “… Ismos! E o homem?”. E não resisto a uma provocação. Será a servidão a condição humana? (que me perdoem, ARENDT, MALRAUX e MAUGHAM).

Nestes dias, as circunstâncias circunstanciais do homem português são nebulosas. Num país com o número de cidadãos que o nosso tem, saber que 20% da população vive abaixo do patamar da pobreza é deveras preocupante. E mais ainda é perceber os efeitos que algumas medidas provocam na classe média, principal motor de qualquer economia. Os avisos vêm de vários lados. Mas, os que mais me impressionam são os do Banco Alimentar contra a fome, que relata professores, advogados, psicólogos e afins entre os que frequentemente procuram ajuda para subsistir.

Artigo de opinião publicado no Jornal O Primeiro de Janeiro em 6 de Dezembro de 2007

também disponível em:
http://intransmissivel.wordpress.com


Vicente Ferreira da Silva

 
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