Poemas : 

aos intelectuais do meu país... e arredores

 
os cães ladram
e a caravana passa ouvi dizer

e não foi no tempo
naquele bom e velho tempo
em que as galinhas tinham dentes

foi hoje agora aqui enquanto o verso
gritava a dor do corte do cordão
umbilical e o líquido amniótico
lhe cobria o corpo
bem mesclado com sangue de metáfora

no entanto é um facto bem concreto
os cães ladram e lambem-se enquanto
ajeitam o risco do pêlo
que a cabeça lhes cobre frente ao espelho

dizem poema em vómito aplaudido
por toda a plateia black tie

mas a caravana passa

a caravana
exagero de poeta

um mero vagabundo
vagabundo que nada tem que nada
tem

nada como quem diz
uma frase colhida no pomar
de irene lisboa

uma mão cheia de nada
e outra de coisa nenhuma

nada como quem sente
o sol que leva na algibeira
como o outro vagabundo no poema
do manuel da fonseca

e os cães ladram persistem em ladrar
e ficam por ali
parados a ladrar
na berma da estrada da vida

nem reparam que do osso
nada resta

enquanto é o vagabundo
o tal do sol na algibeira
o tal das mãos cheias de nada
e de coisa nenhuma
que caminha
para o regaço da memória
futura de todos os homens



Xavier Zarco
www.xavierzarco.no.sapo.pt
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Autor
Xavier_Zarco
 
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