Algo está prestes a partir, a quebrar, a não resistir
As feridas sossegadas na sua cura explodem em bocados
Jorrando em mares extensos de sangue escuro e antigo
Rebentando com todas as crostas que saravam nos seu próprio tempo
Trazendo ao de cima todos os medos e receios
E o Amor novamente se esconde mais fundo ainda que anteriormente
Para que nunca mais seja encontrado levando um rasgo de feridas que abriu
Deixando um rasto de destruição interior que não se vê mas queima
Queima todas as cicatrizes velhas por onde passa provocando dor
E tudo arde ... explosões de ira e revolta surgem em rasgões de carne
Cada ferida berra por si, cada cicatriz ... AAAHHH
Não mais ... eis chegado o final da viagem da luz e o EU quer voltar
Para o profundo que estava pois é onde se sente em segurança
Longe de tudo quanto possa existir para não mais sofrimento causar
Pedaços que são brutalmente arrancados e que me rasgam por dentro
Deixando a pele exposta ao intenso calor da raiva dos outros
Tento tornar os meus movimentos calculados e simples
Procurando impedir que a dor tome conta do meu ser
E me transforme, me leve rapidamente à loucura
As feridas que soltam sangue por momentos intemporais
Descontroladamente, empurrando tudo no seu caminho
Com uma força tal que outras feridas se abrem
Crostas que insistem em sair, a cada passo, a cada respiro
Provocando um grito mudo de dor que sai de uma boca aberta
Descubro o Anjo negro me envolve o coração
No seu todo de existência divina abraçando a minha a Alma
Num gesto subtil de compreensão falsa e escura
Enterrando o pouco que vou sentindo no mais profundo do ser
Onde não mais terei acesso pois não consigo chegar
E essa Tristeza que me deixa feliz pela sua força em resistir
Mas que magoa por tudo quanto de bom me tira
Deixando um vazio reconfortante de mais nada existir
Alojada numa respiração explosiva de dor
Onde não existe claridade e a vastidão do vazio é sem fim
O Amor que insiste voltar em investidas vorazes e avassaladoras
Mas que perdura escondido por detrás de uma qualquer ferida
Para onde volta subitamente, tão depressa quanto apareceu
Levando todo o esforço cru que faço para evitar o seu retorno
A acelerar a fuga arrastando tudo quanto apanha
Até à escuridão de onde nasceu e esperou o seu momento
Destruindo qualquer vontade de existir em felicidade
Esforços destruidores que vou fazendo para sobreviver
Onde curo uma ferida que doí, e outras tantas se abrem
Mais pedaços que são arrancados em força
Que me rasgam por mim todo, levando o carinho
Roubando a paciência e a compreensão
Aos poucos vou ficando destruído por dentro e por fora
E as forças vão desvanecendo numa revolta de tristeza
Onde os pensamentos me lembram da solidão eterna
Mesmo não sabendo o que é a eternidade
Pensamentos cíclicos que esta vida não merece ser vivida
Mas nada mais posso fazer a não ser esperar ...
Adormeço num sono consciente, de dor interminável
Onde um pássaro negro me abraça nas suas enormes asas
Num aconchego que parte todos os ossos e pede mais um grito
Grito que não sai, que não se solta, que não existe
E o cansaço acaba por vencer a dor, as forças evaporam
E eu fecho os olhos pois já sei o que me espera ...
Eis que me dás a mão, a tua mão suave e linda
Sussurras ao meu ouvido, que mal ouve, "estou aqui"
Aconchegas as feridas com o calor da tua respiração
Quase que consigo senti-las a curar instantaneamente
Encostas a tua cara à minha, num toque de carinho
Acompanhas o meu andar numa proximidade quase de fusão
Transmitindo o calor e a serenidade do teu ser para o meu
Adormecendo a minha dor nem que seja por segundos
Dando descanso ao meu coração, à minha respiração
Em abraços incondicionais num profundo silêncio
Enches com um pouco da tua leveza a minha alma
Acaricias as crostas em movimentos circundantes
Chamas o Amor que se esconde atrás das feridas
Baixinho dizes ... amor ... mas ele nem precisava disso
Pois só pela tua proximidade ele apareceria espontaneamente
E o meu EU deixa-se ir, nesta panóplia de acontecimentos
Sem pensar, sem analisar, sem ver, pois precisa de ar
E mostra-se nu, sem medo, nem receios, nem preconceitos
Precisa de voar, de se soltar do abraço do Anjo Negro
Libertar-se destas feridas que consomem a Alma
De acreditar que existe algo mais na vida, algo sem dor
Algo de vivo que cresce, que provoca palpitações
Que em formatos incondicionais existe só porque está vivo
E vive só porque existindo tem toda a força do mundo
Sabes bem que o despertas, e as recompensas que terás
Numa eterna gratidão independentemente do tempo
Despertando todos os valores que falam mais alto
Junto com o mais sincero sentimento de gratidão pela vida
O Sol na sua luz eterna volta a iluminar e a aquecer o ser
Chamando a Lua para os acompanhar nesta nova caminhada
Onde as estrelas brilham na sua maior intensidade
Permites que o meu coração se una ao teu cheio de vida
Mostras-me num sem fim de borboletas de todas as cores
Que a vida é realmente bela e merece ser vivida como É
E num abraço apertado dizes ... "vai ficar tudo bem"
Blackbirds like small priests walked in the silent fields.
[ wilderaven @ lusopoemas ]