Uma senhora viúva, muito pobre, muito arreigada ao bom nome e aos bons costumes, vivia na sua casinha e pouco a pouco se ia desfazendo dos parcos haveres para prover o seu sustento.
Tinha um filho de oito aninhos, que a ajudava muito nas vendas e a surpreendia com a argúcia da sua arte de convencer os compradores e negociantes mais diversos.
Mas certo dia apareceu em casa com um maço de notas, proveniente da venda de um pato, último recurso que lhes restava da capoeira, outrora bem povoada...
A mãe, muito cuidadosa,quis saber como poderia um só pato ter rendido tanto dinheiro:
O filho esclareceu:
- Fui de porta em porta com o pato debaixo do braço, mas ninguém vinha abrir...até que lá em cima junto da farmácia, um senhor olhou à volta...olhou..olhou e quando viu que ninguém andava por perto, tocou à campainha.
Veio uma senhora abrir a porta e aí eu entrei junto com ele a pedir que me comprasse o pato...Estava eu a pedir "Ó Senhor compre-me o Pato! Compre!" quando alguém mete a chave na porta da rua e começa a abrir...
Aí a dona da casa fica aflita e grita:
- Mas agora que faço com estes dois... o meu marido voltou...estou perdida...Entrem para este roupeiro e fiquem quietos a calados. Quando o meu marido sair eu abro a porta..
Fiquei trancado com o senhor e o pato debaixo do braço. Então eu tive uma ideia e disse:
-"Senhor compre-me o pato !" ao que ele respondeu que não precisava do pato para nada.
Aí eu ameacei: ou me compra o pato ou eu grito! O homem comprou! Daí a pouco voltei ao ataque:
-Senhor dê-me o pato!
-O Pato é meu, respondeu ele... se ainda agora mo vendeste...
-Senhor dê-me o Pato, se não eu grito!
-Pronto! pega lá o pato mas fica calado!...
Fiquei com o pato outra vez...mas voltei às ameaças e assim vendi o pato cinco vezes e ainda o tenho aqui comigo.
A mãe ficou contente com os dez contos que o filho trazia e com o regresso do pato à capoeira, mas a sua consciência falou mais alto e disse:
Filhinho,isso que tu fizeste, foi bom para nós, mas foi um grande pecado... tens que pedir perdão a Deus e vais imediatamente confessar-te ao senhor prior da freguesia que por certo te irá absolver, desde que te mostres arrependido.
O rapaz lá foi.
Entrou na igreja.
Era dia de confissões. Ajoelhou-se junto ao confessionário e começava a contar a história do pato, quando, para seu espanto ouviu o prior gritar:
- Outra vez, Não!... já te dei dez contos...que mais queres agora?!
José Mota