Poemas : 

a urgência de dizer: mãe

 
mãe
há duas coisas que preciso dizer-te

entre a chávena repousas a mão
fria a mão, a tua, a que te amputaram à nascença.
o cotovelo gasto preso ao pó da mesa,
longe do braço,o teu, o que nunca foi perto.

há duas coisas que preciso dizer-te
mãe

duas mortes são o teu pequeno almoço
bem como um assalto à mão armada.
notícias da tua manhã, nossa.
ainda estás longe.

mãe.

tu gritas
tu levantas a mesa
tu choras um pouco
tu foges à pressa

mãe
há duas coisas que preciso dizer-te

a rua a servir de casa aos teus pés desesperados
fracos os pés, os teus, os que agora se encostam à berma.
a mão repousa ainda sobre o teu peito,
fria a mão, a tua, a que te amputaram à nascença.

grito: mãe. eu vou embora e não volto.


. façam de conta que eu não estive cá .

 
Autor
Margarete
Autor
 
Texto
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 04/10/2008 08:53  Atualizado: 04/10/2008 08:53
 Re: a urgência de dizer: mãe
Um poema de realismo cortante em que que sobrevivem a palavra mãe e o manifesto talento poético e literário da autora.
Parabéns. Beijinho.
PS.: Margarete, por favor escreve mais poesia e menos prosa porque eu já deixei de ler tanta crónica que sempre bate no mesmo. Embora imagine que haja por aí muitas belíssimas prosas que eu, por opção e falta de tempo, deixei de ler.E também por entender que o poder transformador da poesia é incomensuravelmente maior que o da crónica que nem é carne nem peixe. Outro Beijinho.


Enviado por Tópico
RoqueSilveira
Publicado: 04/10/2008 09:10  Atualizado: 04/10/2008 09:10
Membro de honra
Usuário desde: 31/03/2008
Localidade: Braga
Mensagens: 8112
 Re: a urgência de dizer: mãe
Às vezes não é fácil aos pais entenderem os filhos, porque a maioria pensa que eles lhes devem obediência, sem ter em conta que os devem guiar, apoiar, acarinhar, mas sobretudo ouvir...bem, há situações em que o tratamento de choque é preciso e resulta! Mas tudo deve ser feito com amor e passando a ideia para os filhos de que a mão da mãe é forte, segura e está sempre presente...Bem, comigo resultou!!! Abraço



Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 04/10/2008 09:35  Atualizado: 04/10/2008 09:35
 Re: a urgência de dizer: mãe
Excelente...
Li, na sua resposta ao comentário do Henrique, que se considera livro e não poema... Pois eu acho-a com talento para prosa ou poesia, tanto faz! Porque o importante é a intensidade, força e sensibilidade que acrescenta aos textos... e isso, sim, nasceu consigo
Um beijinho de parabéns.


Enviado por Tópico
Alemtagus
Publicado: 04/10/2008 11:05  Atualizado: 04/10/2008 11:05
Membro de honra
Usuário desde: 24/12/2006
Localidade: Montemor-o-Novo
Mensagens: 3408
 Re: a urgência de dizer: mãe p/ Margarete
Tantas coisas que se calam... choro as tuas palavras.

Mar de (s)Al
Beijo


Enviado por Tópico
flavio silver
Publicado: 04/10/2008 12:27  Atualizado: 04/10/2008 12:27
Colaborador
Usuário desde: 24/09/2007
Localidade: barcelos
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 Re: a urgência de dizer: mãe
olá mar. um poema muito bom. gostei das sensações que decorrem a cada verso.
está um poema digno de ser editado.
bjs.


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 04/10/2008 14:12  Atualizado: 04/10/2008 14:12
 Re: a urgência de dizer: mãe
Mar,

Adorei este teu poema tão realista, e quando á tua resposta sobre o comentario acima referido, tens toda a razão quando dizes que a prosa não pode nunca ser considerada inferior á poesia, fazem todas parte da arte de escrever, eu pessoalmente gosto muito de ambas.
Li algumas das tuas prosas e adorei, pela tua forma original com que as escreves.


Beijinhos

Luisa Raposo


Enviado por Tópico
Valdevinoxis
Publicado: 04/10/2008 17:06  Atualizado: 04/10/2008 17:06
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Localidade: Aguiar, Viana do Alentejo
Mensagens: 2118
 Re: a urgência de dizer: mãe
Já te disse antes e noutro sítio, coisas boas sobre esta tua poesia que teimas em menosprezar e que todos teimam em gostar.
Quer queiras, quer não, és poesia mesmo que escrevas prosa. Chama-lhe dom ou fatalidade se quiseres, que eu chamo-lhe Margarete.
Gosto de te ler neste registo forte que se impõe aos olhos de quem lê.
Por favor, não digas que não és "boa poeta"... olha que mentes e só te enganas a ti.

Valdevinoxis