Estava o gordo Abade posto em sossego
Do seu lauto almoço tirando bom proveito
Naquele engano de alma ledo e cego
De quem leva o dia a dia bem satisfeito.
Longe estava de imaginar
A má sina já traçada:
Era a barriga a aumentar,
E a medicina a diagnosticar
“Barriga d’àgua” complicada.
Consultados os cirurgiões
Da cidade e do povoado
Não divergiam as opiniões
E o Abade ia ser operado.
Decorreu a cirurgia
Com toda a normalidade.
Recuperava da anestesia,
E ao lado, na Maternidade,
Um lindo bébé nascia
Filho de mãe solteira
Que no parto falecia.
Foi tão grande a confusão
E maior a fatalidade
Que o néné foi então
Parar à cama do Abade.
Quando este acordou
E viu tão lindo menino
Ficou triste e pensou:
“...que coisas há no destino!
Mas oh! que grande espiga!
Será que o Doutor o achou
Dentro da minha barriga?”
Conluiadas as enfermeiras
Confirmaram ser verdade
E até foram as primeiras
A dizer à Governanta
Que a Santidade era tanta
Que por este andar, no povoado
Haveria Santo canonizado.
Com o avançar da idade
O Abade envelhecia...
O Sobrinho, na puberdade
Frequentava a faculdade
Rejuvenescendo dia a dia.
-“Sobrinho, vamos conversar
tenho algo aqui guardado”...
Era o Abade a hesitar
Se deveria ou não contar
Tudo, agora ao afilhado.
-“Padrinho! Não diga nada!
Esqueça...o que lá vai, lá vai
Eu já há muito desconfiava
Que o senhor era o meu pai”
“-Filhinho meu, estás errado!
Seja milagre ou não
Eu sou a tua mãe,
O teu pai é o sacristão!"
José Mota