Escuto a chuva dos olhos do mundo
E de quererem ser mares são ínfimas as minhas mãos
Em todos os peitos dilacerados
Por todos os peitos negros de descrença
Eu clamaria p`la urgência da fábrica de corações ardentes
Das minhas mãos esmagadas pela ausência de outras mãos
Ainda tenho todo o fogo do mundo
O fogo de acalentar Invernos eternos de desamor
Retenho em mim imensas e impotentes tristezas
Inacções e desalentos alheios
Fatigo as pernas nos trilhos não ousados por outrem
Entrego meu olhar em penhor da minha verdade
Desnudo-me para melhor se entenderem
No mistério das claridades
Alimento-me de sol de lua e de mar
Deito-me de esperança na praia deserta
Faço-me de temperança entre tempestades e calmarias
Exibo o infinito querer por dentro do ínfimo ser
Disperso afectos ao desbarato
Sem conta e sem medida
Coração sem peso de mágoa
Fogo dado em escuridão alheia
Olhos de alma em sol nascente
Abjuro o vulgar em mim
Renuncio palavras pueris
Se eu disser:
Salve-se quem puder, salva-se quem
Pode ter a infinita graça de ter sangue nas veias!
Salvam-se poucos
Salvam-se os de muito querer
Pertences também aos eleitos
Salva és pelo teu próprio amor
Pela sublime vontade de bem-querer
Pela vontade do amor decantado
Se me falta som na voz
Ou palavras no poema desenhado para ti
Invento a floresta em sinfonia
Faço-te cama de alvas flores e frutos do bosque
Tela e papel do poema pintado corpo a corpo
Sangue suor e sémen efervescentes
Aromas e sabores na cor do poema
Desejos em tela decalcados
Agora contamos o nosso tempo
Em palavras de som e de cor
Grão a grão em todas as praias do mundo
Iluminas-me com a rosa cor de sol
E fazes do meu mar tua interminável viagem
Dionísio Dinis