é de dentro da noite que te falo, encostada à nudez de uma árvore que o nevoeiro do monte encobre, espero, sibilando algumas palavras, intrusas de um peito dorido de outras esperas, tardias, pesadas como pedras atadas umas ás outras, formando colinas, criando barreiras, do chão ao céu, impecilhos de uma vida feliz. o negrume das minhas falas atiro-o contra a encosta que corre, corre para o rio com uma pressa que lhe é sublimiar, fecha-se em copas e silência algumas ânsias, uns restos de carne lançada a cães e a civilização, mais abaixo, do rio ao fundo, adormece a noite num travesseiro qualquer. podia ser qualquer coisa isto, um veneno na boca do senhor que espreita à janela dos vizinhos, um isqueiro que acende o rastilho de uma bomba que há-de explodir, não tarda. e o barulho que se ergue por sobre o nada arremessa-me algumas memórias, gastas como as raízes onde me agora deito, descanso, o repouso da alma penada que volta dos mortos para se vingar da vida. é de dentro da noite que te falo, com os cotovelos preenchidos de dores incalculáveis, com um poço no lugar do coração, onde se afogam tristes as horas, o tédio, o teu paradeiro, o adeus antes negado. a chuva cai ligeira ao longe, cai sobre o rio, o rio que desata a correr em direcção ao mar e eu dissipo-me em sal e corro, choro, morro, no adeus último.
. façam de conta que eu não estive cá .