Teu corpo desliza no ar, agita-se em ritmos lentos, seguindo o compasso da dança. O céu escuro da noite, aconchega-te a alma. Estendo-te a mão, ofereço-te o meu corpo como suporte do teu, meu ombro para repousares tua cabeça, e dançamos. Não existe música, mas ambos conhecemos o ritmo da vida. Os corpos colados acompanham-se em passos calmos, uma troca de silêncios, de olhares e sentimentos.
Escuto os teus pensamentos, conheço-te, sei entender nos teus gestos o próximo passo, sei perceber num olhar a frase que se segue. Há muito que te sei, há séculos que te ouço, há uma eternidade que te sinto. Falas, sem nada dizer, porque nada precisa de ser dito, apenas, sentido. Mais um passo, uma nota perdida nesta música inaudível, bailado perfeito, corpos em movimento.
Ouves os meus lamentos, que com o vento afagam teus cabelos, escutas porque ouvindo também te libertas desse peso, da mágoa imensa que carregas no peito. Sabes ouvir-me como ninguém, conheces-me porque me encontras em vários homens, porque sabes da minha existência deste o princípios dos tempos. Já conheces os prantos da humanidade, vê-los crescer e morrer em tantas almas.
Acaba a música, mas continuamos ali, no meio da sala, corpos colados, almas pegadas, em pleno desalinho, reconfortadas, abraçadas.