veio de longe. às costas trazia uma mala do tamanho do mundo e era o mundo lá dentro em forma de memórias, tempos entre o entardecer e o anoitecer, lugares entre espaços de antes e espaços de depois. veio devagar. nunca teve pressa de se abandonar nas esquinas de rua onde parava e a berma era semelhante em todas as estradas, não se podia amaldiçoar mais. veio sozinho. a vida parecia-lhe leve e sabia que lhe cabia a árdua tarefa de a carregar, sozinho como sempre esteve, ainda que de tão só se fizesse acompanhar por um ou dois amigos imaginários. nada podia ser mais perfeito que uma viagem aos meandros de um mundo novo, sozinho com o mundo velho às costas. ele desconhecia porque raio se calavam os pássaros, não sabia porque nenhuma estrada tinha sinais, ali as pessoas caminhavam para trás e as moscas eram do tamanho de prédios e ele não tinha medo de caminhar mais longe um pouco, descobrir um rio onde as águas fugiam como animais selvagens e corriam para longe, descobrir uma casa do tamanho do dedo mindinho do pé e saber-se anão quando se sentou numa folha para fumar um cigarro. e daquela viagem ele trouxe sequelas, querelas de uma loucura que o habitava e acordou sozinho, sentado no tejadilho do carro depois de uma viagem pela sua mente.
. façam de conta que eu não estive cá .