Vêem-se em cada esquina. Vêem-se escoradas, fechadas ou esventradas. Vêem-se nas cidades, do litoral e do interior, e nas aldeias. Caídas, ou a cair de tristes e abandonadas. Não são e não foram palácios nem por certo monumentos, alias também esses na mesma condição, em muitos casos. São simplesmente os lares que abrigaram os nossos familiares que rumaram à esperança de uma vida melhor, deixando ao abandono o migalho de terra e a casa na aldeia. Onde moraram os citadinos que, com o custo do imobiliário a subir e a perda de condições de vida, fugiram para a periferia. O rés-do-chão foi alugado ao banco que melhor pagou, as alturas abandonadas à triste sorte, acabando em imagem de contraste entre o luzidio e o decrépito. Será a culpa do governo, como é costume apontar, deste ou outro qualquer? Será do povo que desbarata o esforço de tantos para colocar tantas pedras umas em cima das outras? As pedras que caem agora, lançadas pelo vento e a chuva, e pelo caruncho que mina as madeiras por dentro. Será a culpa de quem assiste, passando na rua, evitando subir os olhos acima do néon publicitário? Será dos proprietários, imóveis como as suas posses, sendo estes quem mais perderão afinal, pelo menos na maioria dos casos? Serão as culpas sequer importantes? De que serve apontar um dedo, gastar energias a inquirir e a discutir, e nada fazer em direcção a soluções concretas. É ou não mais proveitoso ultrapassar esse impulso, que frequentemente não é mais que sacudir a água do capote, e dar apenas o alerta. Mais um, a tentar sensibilizar no sentido da urgência de olharmos um problema enorme. Mais um foco apontado à necessidade de agir, a quem o possa fazer, sem esperar os tradicionais subsídios. Se as pedras caírem, podem-se construir novos prédios. Mas não são só pedras que caem. Também uma parte das nossas raízes, da nossa cultura arquitectónica e social, e das nossas memória e história se desmoronam, perdendo-se para sempre. Não serão estas pedras mais valiosas? Não terão elas o valor de toda uma identidade, capaz de justificar o esforço individual e colectivo de um povo? Não serão também estas, as pedras que aglutinam os cidadãos à volta de um ideal comum, do valor estético e pedagógico das paisagens conservadas, organizadas e limpas? Não serão elas que ajudam os cidadãos a fazer a transição entre gerações? É certo que nem tudo será salvo, irremediavelmente, já muito está perdido. É agora necessário o esforço para salvar o que ainda é possível. O esforço que depende da imaginação e das acções de todos e cada um, reunindo esforços individuais e colectivos, reconstruindo um país melhor para viver e visitar.
Boa semana!
Garrido Carvalho
Agosto ‘08