O meu canto
tem o eco profundo
de mim e mil outros que fizeram o caminho
do Mundo.
Tem coalhadas, lágrimas caídas do assassínio
da noite morta, na espada das albas madrugadas.
Tem o regurgitar de milenares estrelas novas,
e dos trovadores, todas as silenciadas trovas...
Terá igual verdura, das águas recolhidas,
na noctívaga gruta escura.
Terá da altaneira montanha, quiçá o reflexo
de uma luz algo estranha, que a beija, que a morde
e que a purifica, quando banha ...
E das erectas colinas a tenaz vontade de perfurar
neblinas.
E no azul do céu, tesouradas inopinadas das
minhas próprias asas...
E se ser poeta é loucura,
o meu canto, tanto tempo em mim silenciado,
cantará alto todas as brumas das madrugadas,
cantará as poeiras ácidas das estradas
cantará os alcatruzes das noras
(o teu pranto, quando choras ...)
Cantará os pessegueiros floridos, os seus
adocicados cheiros. E das donzelas o desejo
povoado nos bicos dos seus seios. Dos mancebos
o alargar dos seus ombros e dos peitos,
em anseios de deleite ...
E cantará a agonia dos humanos defeitos.
E cantará em contraponto, as flores a despontar
nos pomares. Que aqui, neste Mar das Caraíbas,
juro a Itzamná, Deus criador,
Supremo Senhor do fogo e do das coisas do coração,
que o cantarei ardente e alegremente,
que lhe presto veneração.
Que farei da palavra a santa espada.
Que adorarei os altares de Ixchel, a Deusa Lua...
Que me renderei a Kinich Ahau, vergada ao Deus do Sol.
De joelhos, curvada,
invisto-me das coisas banais e de ancestrais sabedorias.
O meu canto terá o eco profundo nas rotas de antigos Mundos Mayas.
***
(México, 21 de Março de 2007)
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