Poemas : 

balada do homem sólido

 
brincas com as pedrinhas e fazes muitas perguntas
saltas dos braços da tua mãe e olhas a tua volta, curioso
/como se a morte não existisse
vais para a escola e começas a esquecer
brincas e jogas futebol nos intervalos
e ensinam-te os ritmos e a submissão tranquila
/como se a morte não existisse

depois descobres o teu par e começas a passear
esquecido – corres e ris e bebes com os teus amigos
/como se a morte não existisse
na universidade, ignoras o fim da noite
saltas e cantas e depois estudas na véspera dos exames
/como se a morte não existisse

depois conquistas o primeiro emprego
já quase não fazes perguntas, continuas a viajar
/como se a morte não existisse
compras uma casa e começam a viver juntos
esquecido dos jogos e das pedrinhas
por duas noites foges de ti, enganando o dia
levantas os braços e sorris, contas e ouves piadas
/como se a morte não existisse

depois há um tempo em que tens filhos
cuidas deles e fazes por que aprendam a ser como tu
reais e concretos, sem perguntas, nem duvidas
/como se a morte não existisse
chegam os filhos dos teus filhos
continuas a fazer o que se faz para que o tempo flua
sem inquietação, entre festas e trabalhos
/como se a morte não existisse

depois morres


Nota: todos os textos neste espaço estão registados no IGAC, mas podem ser livremente copiados, desde que me mencionem como autor, tenham link para http://forteondaserena.blogspot.com/ e reproduzam esta nota, sem alterações.

Carlos César Pacheco, 5 de Julho de 2008, madrugada
 
Autor
Azul_Fogo
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Enviado por Tópico
Bruno Sousa Villar
Publicado: 20/08/2008 21:28  Atualizado: 20/08/2008 21:28
Da casa!
Usuário desde: 09/03/2007
Localidade:
Mensagens: 429
 Re: balada do homem sólido
Texto fantástico.

Com espanto literário,Bruno

Enviado por Tópico
Julio Saraiva
Publicado: 20/08/2008 21:33  Atualizado: 20/08/2008 21:33
Colaborador
Usuário desde: 13/10/2007
Localidade: São Paulo- Brasil
Mensagens: 4206
 Re: balada do homem sólido p/Azul_Fogo
meu caro,

que bom! a poesia, honrada, te agradece.

abração,

júlio

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 21/08/2008 08:06  Atualizado: 21/08/2008 08:06
 Re: balada do homem sólido para Azul_Fogo
já conhecia as suas belas palavras e tenho o previlégio de receber os seus poemas no meu email.

Gosto bastante de o ler.

Abraço.

Enviado por Tópico
solange Bretas
Publicado: 21/08/2008 18:17  Atualizado: 21/08/2008 18:17
Participativo
Usuário desde: 29/06/2008
Localidade: São Gonçalo
Mensagens: 19
 Re: balada do homem sólido
Belíssimo texto. Descrevestes de forma linda a cronologia da vida. Grata sempre, pelos emails...lembrou de mim?rsrs Bjão

Enviado por Tópico
jessé barbosa de oli
Publicado: 21/08/2008 18:40  Atualizado: 21/08/2008 18:40
Da casa!
Usuário desde: 03/12/2007
Localidade: SALVADOR, Bahia
Mensagens: 334
 Re: balada do homem sólido
É DE ACACHAPAR A MEDIOCRIDADE POÉTICA.
A MIM, PARECEU UM OLHAR LANÇADO SOBRE
O ALHEAR-SE Á FUGACIDADE DA VIDA.
DE FATO, É UM EXTRAORDINÁRIO POEMA. MEUS EMOCIONADOS APLAUSOS!

Enviado por Tópico
Margô_T
Publicado: 22/07/2016 08:51  Atualizado: 22/07/2016 08:51
Da casa!
Usuário desde: 27/06/2016
Localidade: Lisboa
Mensagens: 308
 Re: balada do homem sólido
“como se a morte não existisse”… até que existe e nos apanha de rompante.
Brilhante este teu modo de mostrar o fluir do tempo: desde as brincadeiras com “pedrinhas” e as “muitas perguntas”, passando pelo “futebol nos intervalos”, o “passear esquecido”, o ignorar do “fim da noite”, as viagens, e os filhos e netos – que se querem “reais e concretos, sem perguntas, nem dúvidas”.
Destaco dois momentos particularmente curiosos que referes: o de passar das “muitas perguntas” para o “já quase não fazes perguntas”; e o do ignorar o “fim da noite” para o “duas noites foges de ti, enganando o dia” (onde a noite surge, em ambos os casos, como a altura em que se dá a fuga, apesar de surgir, em ambos os casos, por negação dela própria – ignorando o seu “fim”)

“como se a morte não existisse”… porque é necessário “fazer o que se faz para que o tempo flua/sem inquietação”.