CANÇÃO PARA A MINHA VIÚVA

Amigo Tony,

Eu quero meu enterro com muita música e bebida. Quanto ao fato da coitada ir para a China, só mesmo na poesia. Porque da minha parte, ela corre sério risco de herdar dívidas. Você já viu jornalista e ainda por cima poeta ter dinheiro? A China só mesmo para efeito de rima. E olhe lá.

abração, irmão.

júlio s.

POIS É AMIGO JULIO PENA SER JORNALISTA AI NO BRASIL AQUI ESTAVA RICO E JUNTANDO A POESIA TRADUZIDA TERIA OS COFRES DO BANCO A ABARROTAREM.

EU SIGO ESTA NOITE PARA PEQUIM

Está chovendo muito por lá...

O problema, amigo Fernando, que aliás homenageou de um só gole - e muito bem - teu xará famoso e a doce Florbela, é que a minha infeliz viúva corre o risco de herdar dívidas. Não sei se terá como chegar na China. Mas acredito que terá de sair correndo do bairro onde moramos.

júlio s.

Sim, amiga Helen, senhora dos vitrais libidinosos. Quem fica viúvo realmente é o morto. Mas com relação a ir para a China, a coitada da viúva terá de se contentar - se depender da minha conta bancária - no máximo com Osasco. Até porque jornalista rico no Brasil só se for da laia do Amaury Jr., que vive de picaretagem. De modo que viagem pra China só mesmo no poema, a menos que ela dê sorte de conhecer algum chinês milionário, correndo ainda o risco do cara ser um contrabandista, do time daqueles que têm lojas na 25 de marco e caraoquês, que na verdade são prostíbulos e clubes de carteados camuflados na Liberdade.

afeto,

júlio s.

....rs...praga de defunto pega???...ai Jesuis...tomara que essa viúva vá para o BBB e encontre lá um jovem sarado e ganhe o prêmio final...vire celebridade....e faça uma estátua de homenagem na sua lápide....hehehehe

Amiga Helen,

Por mim, prefiro que ela se acerte com o filho do Fernandinho Beira-Mar do que com um BBB cheio de músculos e nenhum miolo. Quanto à possibilidade de erigir uma estátua, só se for para colocar dentro de casa, o que seria um transtorno, já que o apartamento é pequeno e o impasse seria criado: ou ela ou a estátua. Isto porque já deixei claro a vontade de ser cremado, sem velório, sem nada. No ato. Que é pra fazer de conta que simplesmente tomei chá de sumiço. Penso mais ou menos como o samba do Nelson Cavaquinho: "Me dêem as flores em vida/O carinho, a mão amiga para aliviar meus ais/Depois quando eu me chamar saudade/Não preciso de vaidade/Quero preces e nada mais." Pois eu, de minha parte, nem preces quero. Não que eu não acredite em Deus. Mas foi Ele quem não acreditou em mim.

júlio s.

Minha irmãzinha Núria,

Tudo o que escrevi é a pura verdade. Só não a viagem para a China, já que o dinheiro que tenho quando muito dá para uma semana mal e mal na Praia Grande, que é lugar de farofeiro. A não ser que a viúva arranje um chinês rico por aqui. Mas corre sério risco de ele ser contrabandista ou dono de cassino clandestino, como há muitos aqui em São Paulo, camuflados de ingênuas casas de caraoquê.

afeto, Núria e beijos nas crianças.

júlio s.

Bem, minha prezada Zélia, não adianta encarar de outra maneira. Porque quem enviúva, na verdade é o defunto. Neste meu poema, a única coisa não verdadeira é a tal viagem a China. Motivo: o dinheiro que tenho, mal dá para ir a Osasco, que é um município colado a São Paulo. A menos, é claro, que a viúva em questão ganhe na loteria ou encontre um chinês milionário. Neste segundo caso, existe algum risco. Aqui em São Paulo há muitos chinês envolvidos com contrabando e jogatina clandestina. Pode ser uma fria. E eu não gostaria de ver minha doce amada envolta em maus lençóis. Talvez apertando um pouco ela consiga ir até Buenos Aires, aliviar a saudade de mim ouvindo bons tangos talvez.

aceite o meu afeto,

júlio s.

prezada tânia,

na morte quem enviúva é o defunto. quem fica, continua no mundo. minha mãe costuma dizer, pra quem vai uma lágrima (uma só) pra quem vem um sorriso (mas muitos). agora, dinheiro meu para ir a china, a coitada não vai ter. porque minha conta bancária só dá mesmo para ir até a praia grande - e olhe lá. china só se ela na mega-sena ou arranjar um chinês rico, correndo o risco de topar com um contrabandista.

afeto, júlio

É um texto que começa sério e depois cai no deboche. Porque na verdade, Val, minha concepção da morte esta. Todo mundo se espanta quando digo que não fui ao enterro do meu pai. E não fui mesmo. E no caso deste meu poema, quem enviúva é o defunto. Porque quem ficou está livre para cair no mundo. Só que dinheiro para a minha viúva ir para a China só mesmo no poema, onde tudo é possível. O que tenho na conta bancária, no máximo dá para ela ir até Praia Grande, que é um lugar horroroso, pertinho de São Paulo. As duas únicas possibilidades de ela ir a China são estas: ou ganhar na loteria ou se acertar com um chinês milionário. No Brasil existem muitos, mas a maioria dedica-se a negócios ilícitos, como contrabando e exploração de jogos de azar em cassinos camuflados. Não sei se o risco vale a pena.

grato pelas palavras, meu caro.

afeto e admiração,

júlio s.