Ancorou sua idade em improváveis 57 anos. Já beirando os 70 não abdicava os 57 que retinia e mantinha nos perfis na “internet” e na vida. As “croacas” já fundiam o barco da vida ao impossível cais dos 57 anos. Dali tudo levava a crer sairia morta, as fotos mesmo as antigas não mais correspondiam à idade anunciada..... Aos amigos funcionava seu ouvido de mercador, á reclamação que nunca alterava a idade, aniversários, repetidas velas, idade invariavelmente igual. Chegou-se a pensar que além da vaidade, do desejo de juventude, havia naquele inconcebível 57 algo oculto que a numerologia ou o esoterismo explicasse . Mas qual, fora um numero como outro qualquer que a havia feito terminar sua vida aos 57, independente dos anos que tivesse em sua morte. Ali ancorada se descobrira amando e imaginando-se amada, por um homem 20 anos mais jovem que a idade escolhida e trinta e muitos da idade da vida, que conhecera num sitio de relacionamentos. Entregou-se por completo, embevecida da juventude do parceiro. Seus olhos lhe mentiam um sentimento de amor nos olhos sagazes e gananciosos do jovem. Não poupava em satisfazer-lhe os desejos, inventava novos, satisfeita, exausta de sexo sem carinho, carinho este que inventava sem ter, adormecia imaginando-se feliz. Sem perceber ofereceu-lhe o mundo, e deu o seu, para este amor inconcebível para quem via, ansiado por ela que o desejava há tanto. Ao ver derrocadas suas contas bancarias, imóveis vendidos, carros re-financiados, sobrando apenas uma misera poupança a aposentadoria e um apartamento conjugado na pior parte da cidade, desesperou-se. Mais ainda ao sumiço intempestivo do seu amor menino, que tudo levara em roupas, carro e dinheiro e desaparecera sem despedidas, apenas desaparecera.
Deixara um rastro de dor e as indefectíveis críticas abertas e veladas, dos amigos e dos poucos parentes distantes com quem se relacionava. Passada a dor, acostumara-se à nova vida, no bairro central. Sem conforto, contando os dias para receber sua aposentadoria e comendo o que era possível com sua pouca renda. Da nova vida a única incoerência da miséria que vivia era o computador e a “internet” para a qual fazia economias impensadas para manter. Amigas e amigos descorçoaram de preveni-la do novo amor jovem e virtual que a “internet” lhe trazia. Naquele seu ancoradouro dos 57 anos, nesta nova fase dizia. – Agora sim posso viver intensamente este amor, pois nada tenho a perder...imaginando-se em noites alucinantes de sexo com seu novo amante virtual. O que jamais aconteceria, pois se nada tinha a perder, tampouco tinha a oferecer. E este e os demais amores que se sucederam pela “internet”morreram antes ou após um primeiro, desconcertante, decepcionante e fugaz encontro do qual sempre se recuperava para um próximo...e um próximo ...
Carlos Said