Nos apressados tempos em que a nossa vida decorre, entre muitas palavras soltas pelas ondas dos media, algumas já vão escasseando, raramente alcançando os nossos sentidos com eficácia, atingindo nas nossas mentes a profundidade dos conceitos.
Nesse caso está a palavra Cultura. Os que da vida têm um sentido muito pragmático perguntam para que serve. Outros, mais intelectualmente artificiosos, querem que definamos o que é.
Vivendo numa sociedade rodeados por bens permutáveis, aceitemos que os bens culturais também possam ser considerados produtos, a contento dos práticos da vida.
Nesse mercado de produtos – hoje em dia já não passivamente expostos em prateleiras de supermercado, mas que literalmente voam em direcção aos olhos e ouvidos do público-alvo – o consumidor que logre encher o seu carrinho com maior número de itens poder-se-á considerar o mais culto?
Será esse desiderato atingido pelo somatório de um certo número de leituras, assistência de concertos de música clássica, teatro, ballets e óperas seleccionados, viagens a certas cidades e visitas a museus escolhidos, como programa mínimo obrigatório?
Na verdade, nessa clássica visão de Cultura parece ter-se estribado todo um Mito em falência, pois que apenas uma pequena parcela da Humanidade a conseguia realizar.
A falta de aderência (para usar um termo do agrado dos economistas) à realidade social desse plano cultural ficou bem patente na pergunta que o homem da rua depreciativamente faz: - para que serve essa cultura?
Ao identificar cultura com erudição, excluindo a sabedoria proveniente dos saberes populares, das vivências tradicionais, das especificidades regionais, da diversidade étnica, gerou-se um grande equívoco.
Alguns dir-nos-ão que terá sido intencional, com perspectiva de perpetuação do poder da classe dominante, mas convenhamos que essa fase histórica foi ultrapassada, visto que a dominação hoje é feita de modos mais eficazes do que pela ideologia.
Sem querer menosprezar os grandes artistas da cena mundial, a diversificada e feérica cultura dos nossos tempos pode ser vista como uma grande arena, que nos mantém fascinados no dia-a-dia. Para isso serve, para nos anestesiar por excesso de sensações. É a velha receita dos tiranos da velha Roma: panem et circensis...
Não queremos ficar numa simples dicotomia maniqueista, reduzindo a nossa análise em afirmações do tipo de que a realidade da questão cultural se caracteriza pela clivagem cultura para as elites versus cultura para o povo.
Relativamente ao nosso velho “jardim à beira-mar plantado”, não nos parece merecedor de grande polémica considerar que o nível geral de cultura geral das populações é actualmente baixo.
Seria pois um desígnio nacional colocar a fasquia a um nível mais elevado. Porquê, para quê? Como?
Muitas perguntas para as quais os profissionais do ensino, da comunicação social, agentes culturais, educadores em geral, famílias e toda a sociedade civil no seu conjunto têm de encontrar respostas.
José Jorge Frade