CORPO EM CHAMAS
Maria José Limeira
Este corpo é meu: seios, mãos, curvas.
O uso que faço do meu corpo não pode ser regulamentado por decreto.
Minha criatividade não merece castigo.
Tenho direito a dizer Não.
Recuso-me ao vazio como prêmio.
Não sou obrigada a amar meus agressores.
Sou gente: preciso de Poesia.
Quero adormecer tranqüila, à noite, sabendo que minha missão no mundo será cumprida.
Não cederei meu lugar a ninguém pela força.
Uso a linguagem dos animais. Quem quiser que me entenda.
Vou procurar minha turma selvagem
A coragem é irmã-gêmea do medo.
Quando sentir dores, gritarei.
Tenho que gritar também quando gozo
Meu olhar brilha na escuridão.
Mesmo cansada e ferida, continuarei lutando.
Quero ser única, e não multidão.
Embora fogo seja alegria, pode ser também destruição.
Roubarei os direitos que me forem negados.
Sou inocente, e não ingênua.
Se desistir, perderei contato comigo mesma.
Não cumprirei proibições.
Não chorarei sentada, num canto, sozinha.
Não lamentarei o inexorável.
Irei à luta, mesmo enxergando apenas o que as lágrimas deixam ver.
Não me contentarei com migalhas.
Quero-me íntegra.
O mar que guardo dentro de mim é tão grandioso e intenso que seu nome é outro: liberdade.
A Terra gira ao redor do coração.
Só existe sombra quando luz é réstia.
Saber demais é o primeiro sinal de velhice.
Quando a alma se congela, o corpo morre.
Meu corpo fala várias línguas.
Por trás de cada rosto pálido há um corpo em chamas.
Será preciso milagre para fazer corpo levitar.
Para que caia, basta apenas empurrão.
Somente uma pessoa me ama de verdade, sem impor condições: eu.
Toda vez que tento rabiscar a palavra amor, o que aparece escrito no papel é solidão.
Quando corpo se cansa de esperar por alguém que não vem mais, o melhor a fazer é deitar-se, dormir e sonhar...
(Do livro "Crônicas do amanhecer")