FOLHETINS DE SOL & LUA
Maria José Limeira
O santo do meu altar
tinha um sexo-petisco.
Ouvia pássaro cantar.
O seu nome era Francisco.
Filho do latifúndio,
despojou-se dos seus bens.
Fez discursos no gerúndio.
Mudou de roupa e de gens.
Ao invés de ódio infindo,
tomou amor para si.
Do feio fez tudo lindo.
Cantou música em mi.
Chamou o sol de irmão,
e a lua, de doce dama.
O bater do coração
dá as horas de quem ama.
E a comunhão foi tanta,
com a terra e o ser vivente,
que hoje quando se canta
sua oração comovente,
a Natureza em respeito
levanta as mãos para o céu,
e o que não tem mais jeito
muda o amargo em mel.
Soldado, diz a soldado:
baixa as armas, vem cantar.
Todo ser espoliado
um dia vai se juntar.
A bala que atinge cega.
Dor que esmaga vai passar.
Todo sofrimento é brega.
Toda música tem luar.
Enquanto se abrirem flores,
houver pássaro no infinito,
e alguém morrer de amores,
o meu santo vai ser mito.
Pois quem tem sol por amigo
e lua, por ser amado,
não ficará sem abrigo,
se esquentará do meu lado.
Soldado, diz ao comparsa:
transforma em rosa agora
a bala que mata e caça.
Joga indumentária fora.
O que Francisco falou
sobre esquecer e perdoar
já foi Outro quem ensinou.
E é tão fácil voar!...