Prosas Poéticas : 

Inquietação

 
Tags:  fantasia  
 
Esta manhã despertei em tons de um verde-escuro. Triste. Sem forças para me ver renovado, sem olhos de luz de esperança para ver o caminho a minha frente.
Esta manhã não acordei. Recusei-me. Quis concluir o pesadelo de uma noite que assombrou as entranhas do meu ser. Inquietou-me.
Esta manhã soube que morri dentro de mim, ainda que o meu físico não tivesse assumido, ainda que a roupa tivesse vestido o meu corpo…
Ainda que… Morri, no cair da noite, numa queda de amor!
Esta manhã um corpo saiu para trabalhar. Sem amor-próprio nem um rumo definido.
Esta manhã recordei-me de que nunca voltei ao lugar do paraíso, porque enquanto vivi, não tive tempo para repetir os momentos, pequenos momentos, que marcaram a minha passagem pela estrada do sentimento. Não procurei reencontrá-los.
Este dia, primeiro dia após a minha nova vida, ou na falta dela, foi para procurar essa consciência, perdida, ignorada. Encontrei-a tão perto do meu corpo adormecido.
Agora que a noite cai e a escuridão cobre o meu rosto envergonhado, vou viajar aos lugares onde passei apreciados instantes, mínimos instantes, e, com todo o tempo do mundo, vou desfolhar cada décimo de segundo, saboreando a seiva desses escassos abandonos dos lugares perfeitos.
Cada lugar, cada gesto, será sugado pela minha condição arrependida.
Em lágrimas estarei quando recordar as promessas e os sonhos ambicionados e nunca conseguidos. Se pudesse, teria sido diferente…
Queria apenas viver! Queria apenas ser feliz!
Esta manhã acordei com o calor da tua boca junto do meu ouvido e nas palavras que disseste, dancei, sorri. Deste-me num bom-dia a oportunidade de realizar os desejos, os sonhos e lembrei-me de não perder mais tempo. Fugi!
Agora ninguém me vê, ando ocupado, a reconstruir os momentos que perdi. Ando tão junto de ti que nem sentes que morri!

Amanhã na Côrte-real cumpre-se um funeral…


Escrevo…para libertar as personagens que não consigo Ser!
________________________________________
http://catalogoluademarfim.blogspot.pt/

http://catalogoluademarfim.blogspot.pt/



 
Autor
Paulo Afonso Ramos
 
Texto
Data
Leituras
996
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
5 pontos
5
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
Tália
Publicado: 06/06/2008 23:01  Atualizado: 06/06/2008 23:01
Colaborador
Usuário desde: 18/09/2006
Localidade: Lisboa
Mensagens: 2489
 Re: Inquietação
esta manhã vesti-me de negro


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 07/06/2008 07:05  Atualizado: 07/06/2008 07:05
 Re: Inquietação
Triste, mas muito belo... Fiquei baralhada entre a realidade e aficção tal é a intensidade com que as tuas palavras me invedem e tocam!

Um abraço-saudade

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 07/06/2008 08:30  Atualizado: 07/06/2008 08:30
 Re: Inquietação
Uma perspectiva poética da "inquietação", que não é nada mas tudo poderá ser, nos buracos que o léxico tem, por isso o poeta sobrevive e inventa, socorrendo-se da magia das metáforas e do discurso surreal. Parabéns. Abraço

Enviado por Tópico
Marlene
Publicado: 07/06/2008 15:49  Atualizado: 07/06/2008 15:49
Da casa!
Usuário desde: 08/05/2008
Localidade: Lisboa
Mensagens: 260
 Re: Inquietação
Olá.
Para já agradeço o seu comentário.
Às vezes acordamos assim sem vontade de acordar, em que apetece fechar os olhos e não mais acordar. Em que o corpo anda como se não tivesse alma. Mas são dias...
Gostei muito da sua prosa. Abraços