Nos suores frios que me tomaram: sou água,
Nas incertezas e vagas que naveguei: sou barco,
Nos vôos de gaivota: sou esperança,
Nos silêncios das palavras não ditas: sou rocha,
Nas estrelas que esperei: sou bússola,
Sou água, barco, esperança e rocha: sem bússola.
Sou rocha, esperança, bússola e barco: sem água.
Sou barco, rocha, água e bússola: sem esperança.
Na verdade mesmo, não sou nada!
Campeio a paz de segundos eternos,
Mas não vivo tanto tempo assim.
Procuro o bálsamo das cicatrizes,
A luz brilhante das frestas,
Mas sangram as minhas carnes no escuro,
Tão escuro que eu apenas sinto, não vejo.
Encosta de montanha: encosto,
Intransponível monstro de areia e sal,
Salga-me a pele, esfola-me,
Duna que dança em cada noite;
Muda de lugar, muda de toque,
Muda de temperatura...
Tanto tempo para desperdiçar,
Tanto, que nem dá tempo!
Olho em volta do meu túmulo de alga e conchas,
Estou deitada na areia fria,
Estou morta?
Vivo assim, me olhando, espreitando,
Sobrevivo do naufrágio do meu barco,
Desafogo-me da água dos dias,
E não espero nada, nada mesmo,
Além das rochas,
Das bússolas desmagnetizadas,
Dos mapas comprados em camelôs.
(Pensando bem, isso não tem nenhum sentido. E precisava ter?)