Reduziu-se todo o verbo a nada
e assim ficou, desidratado, seco,
com o vírus de silêncio infecto.
Era sem plano, sonhos ou projeto,
entrado num, sem-saída, beco;
não podia ser chamado d'estrada.
A vida era vã e automatizada;
sem verbo, o Homem era um boneco
sempre são, aprumado, tão correto.
Uma casa sem paredes, nem teto,
portas fechadas, que hipoteco.
Só uma saída, cerrada a entrada.
Como estátua, muito queda, parada,
convida sem vida apenas ao eco.
Não começa, ou inicia: é um inseto.
Homem que não pensa é abjeto,
mais perto do chão que do céu, marreco,
ar de vazio, reles camarada.
Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.
Eugénio de Andrade
Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.
Este texto também foi um comentário a "Para deixarem pensar os nossos Beças" de Alemtagus