Escuto-te como quem contempla um incêndio antigo a devorar o horizonte, um fogo que arde sem pressa, como se soubesse que o tempo é seu aliado. As tuas palavras chegam-me como brasas levadas pelo vento, que cruzam o ar sem tocar a terra. Vejo-te avançar, preso a uma coleira invisível, e cada passo teu ressoa como um trovão distante, como se o chão tremesse por respeitar o peso da tua cólera contida. Falaste-me de alturas, de vistas que enganam. Observo-te descer, não como quem cai, mas como quem retorna ao ventre do desconhecido, um voo ao contrário. Há algo de ritual no teu movimento: tu não perdes altitude, tu entregas-te a ela, como um pássaro que entende que a gravidade é apenas um convite para repousar no inevitável. E a superfície, quando te acolhe, exala o aroma antigo das ferrugens do passado, como se guardasse, no silêncio profundo da terra, os ossos de tudo o que foi esquecido. Quando dizes que fizeste um filho à solidão, vejo-te à beira do silêncio, num quarto onde o ar pesa e o lume já não aquece. Moldas pedaços de vazio em criaturas frágeis, feitas de tinta e eras, poemas que tremem entre ser e não ser. Observo-os como quem olha um ninho suspenso no galho mais alto — pequenos demais para o céu, grandes demais para o esquecimento. Vejo-te sonhar com peixes que voam e mares que se dobram como lençóis. Há algo de bruto e belo nos teus sonhos: são eles que desafiam os limites do que se pode tocar. Permaneces entre o concreto e o impossível, lutando com o invisível, chamando os astros como quem grita num deserto, mesmo sabendo que o eco não responde. Observo-te debater-te contra correntes sem elos, libertar braços que nunca estiveram presos, porque as tuas algemas são feitas de vontade — e há grandeza nisso. És um relógio sem ponteiros, o único capaz de marcar a passagem do desalinho. A faísca que temes é a mesma que te dá forma, um fogo que dança em ti, não para te consumir, mas para te eternizar. Se a vida é uma cidade com ruas apertadas e luzes que vacilam, és aquele que caminha atento às sombras, à procura do que se esconde nas esquinas. Observo-te de longe, em passos, em voz. Os ciclos continuam a girar, mas no teu silêncio partido em dois, ouço a única verdade que importa.
Bem-vindos ao meu refúgio, onde desvendo os mistérios da mente humana através da neurociência e da arte da palavra. Sou uma simples pessoa que, nas horas vagas, se torna escritora, explorando o mundo através da observação. Amante das artes e da diversi...