Prosas Poéticas : 

A Realidade, as Aves e o Silêncio

 
Entendo que, ao chamar a realidade à realidade, procuras o nome certo para aquilo que flutua no indizível. As coisas são — apenas são — mas nós insistimos em vê-las pela geometria dos nossos olhos. Eu também já quis medir o mundo com números e variáveis, como se um fruto pudesse caber no frio exato de uma equação. Mas a centrifugação da vida, o movimento inevitável, destrói todos os labirintos que desenhamos. Não há linha reta que resista à queda. Falas do poeta como insaciável metafórico, e percebo-o: também o sou, talvez menos habilidosa, mas igualmente sedenta. Criamos imagens como quem escava a areia fina à procura de um fio de ouro escondido no caos. As cicatrizes que mencionas, os tempos verbais cravados no peito, doem por não pertencer ao passado. As palavras vivem aqui, no agora, e a ave que chora dentro de ti talvez tenha irmãs em mim — aves de silêncio, talvez de grito, que esperam que as libertemos. Mas nenhuma ave quer ser adorada. Não escrevemos para sermos louvados. Precisamos partir o silêncio em dois, como quem rasga um véu para enxergar o outro lado. Não é estética, nem vaidade — é urgência. Um ato quase mecânico, como respirar, mas onde o ar vem carregado de música e de cansaço. Por isso, recebo as tuas palavras como quem recolhe pequenos fragmentos de vidro, sabendo que podem ferir, mas que, na luz certa, refletem beleza. A poesia é essa dualidade: a ameaça e a revelação, o fruto e a variável, o voo e o peso. Chamar a realidade à realidade, então, é um esforço de nomear o inominável. Tu semeaste as palavras; eu só tentei escutá-las antes que voltassem a flutuar.


Bem-vindos ao meu refúgio, onde desvendo os mistérios da mente humana através da neurociência e da arte da palavra. Sou uma simples pessoa que, nas horas vagas, se torna escritora, explorando o mundo através da observação. Amante das artes e da diversi...

 
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paollalopez
 
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