Quando a manhã irrompe por entre a neblina matinal, sinto o cheiro fresco da terra molhada e o burburinho dos sons que subtilmente acordam em mim, sensações novas que se soltam em gratuidade.
Olho para mim, e reparo em cada pormenor, como se me contemplasse pela primeira vez,
no rosto a ternura escorre, como escorre o orvalho nas madrugadas longas, pelas pétalas das flores.
Acordo o dia em mim, com aquela nítida sensação de agarrar o tempo como se fosse um néctar delicioso, pronto a ser degustado, inspiro e de olhos fechados, consigo sentir o bater do coração da vida, como um embrião prestes a ser cuidado, valorizado, e amado, dando-lhe a primazia de tudo.
Exalto em mim os sentidos, e bebo avidamente cada ingrediente salutar, sorrio para a fé, aconchego-a no peito, olho para a confiança e recordo os caminhos que me levaram a construí-la em passos leves, suaves, comprometidos e afoitos.
Espreguiço-me numa coreografia lenta e esboço um sorriso, deixando a determinação escorrer suavemente e apoderar-se de mim, como se eu fosse sua propriedade, e não lhe resisto.
Ergo o rosto, firmo os passos e deixo-me envolver, como quem conhece bem o caminho, solto o laço branco acetinado da paz que me envolve e deixo espargir todas as partículas no ar, soprando-as ao meu redor cobrindo quem passa como um véu alvo, acetinado que perdura.
Saúdo a persistência e olho-me demoradamente como se selasse ali um pacto num compromisso firme de fazer acontecer o meu dia.
Agarro o dia com os fios condutores da sensibilidade, rego-o com a temperança da atenção e com razoabilidade canto a melodia que me percorre as células, para fazer acontecer um novo dia, na excelência do batuque de todos os meus sentidos.
Alice Vaz de Barros
Alice Vaz De Barros