Na cidade de papel o céu ardia em chamas.
Eram nuvens incendiárias com mais de mil megatons.
Uma orquídea vicejou no asfalto
E o que era semelhante ao vidro
Simplesmente se evaporou .
Lembranças de antanho de algo que não se viveu.
Reminiscências antigas de intrigas que não se previu.
Quando passou aquele cometa
Algumas senhoras caíram de joelhos
E pediram aos deuses, em suas orações,
Que daquele trigo não fosse mais feito o pão.
E os cabelos do príncipe,
Não o de Maquiavel,
Nem o de Exupéry,
Mas do Enola Gay,
Lembraram à atmosfera do porvir do aloirado cogumelo que feriu aquele azul.
Quem se lembra da menina do diário nazista?
Quem, além de mim, lamentou a morte de Bertold Brecht?
Nenhum de Nós cantou a Marselhesa
No aniversário de morte do corso Napoleão.
O homem de lã parecia ao rei nu.
Em milésimos de segundos todas as crianças estavam mortas.
Os carros pararam na contramão.
Os pássaros voaram até morrer.
As mãos fizeram orações
E no céu um novo sol foi impedido
De nascer.
Não pude conter o meu grito de horror.
Não pude sequer segurar com as mãos.
Tentei sorrir, mas de tristeza eu chorei.
E o homem de lã apertou o botão.
A cidade de papel se calcificou com as chamas
E a única orquídea que brotou no asfalto morreu
Negando ao futuro o legado da nossa miserável existência.
Gyl Ferrys