Textos -> Esperança : 

Bez Strakhu

 
O benfica deu três e o porto empatou.
O Oleg, que na verdade se chama Oleksandr, mas que não se importa nada com o engano, trouxe-me, invariavelmente, a um comentário.
O Sasha (soube que Sasha é diminutivo de Oleksandr) não é muito forte no português. Não sei se seria capaz de ler o teu poema e ter a noção das várias camadas e símbolos em que insistes.
Anda na escola, numa iniciativa da junta de freguesia, que apoia emigrantes na inserção.

Os colegas de turma são indianos (talvez do Paquistão), alguns chineses, e uns poucos de romenos de etnia cigana. Sasha é um dos que tem melhores notas.
No trabalho, luta com a escrita do alfabeto. O cirílico deve ser-lhe muito mais fácil. A caligrafia é de ir às lágrima. Escreve há cerca de 4 anos. Ainda assim, há uns poucos que ainda se percebem menos, nascidos e criados na cidade da Amadora.
Já devia escrever como as mocinhas de 9. Ao menos.

No alto do seu metro e oitenta e tal gosta de ir ao ginásio, fazer pesos.
Aos 37 está a fica calvo. Sorri enquanto falha as ligações género e número.
Troca o masculino com o feminino, em alguns nomes. Usa o infinitivo dos verbos, quando devia de usar o indicativo, com humildade.

Quando os utentes têm mais de 150 kgs, estamos sempre à espera que esteja por perto. Ele tem “jeito” para esses casos especiais.
Interessei-me pelo Oleg quando soube que não faria certos trabalhos remunerados, por falta de competências de comunicação.
Pareceu-me injusto que o procurassem para casos pesados, mas abdiquem dele por detalhes que sei que ultrapassaria com mais ou menos dificuldade.

Faço de professor no meio do corredor.

O Sasha prontificou-se a ir a uma festa de Carnaval lá do trabalho, assim que soube do convite, há 3 semanas atrás.
Não sei se tinha máscara.

Anteontem pediu-me desculpa por já não poder ir, com uma dor no olhar que vi hoje no Yaramchuk assim que entrou em campo no jogo contra o Guimarães...

Soube que andava atarefado ao telefone, numa língua em que eu só sei dizer boa tarde, e sem medo.


Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.

Eugénio de Andrade

Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.

Nota: Para os mais desatentos este texto foi um comentário a um poema de Benjamin.
Irmão, espero que não te importes que esteja a usar um texto claramente político na tua página, em vez de falar do belo poema que escreveste.
A seu tempo irei complementá-lo, no fórum por ti criado...
 
Autor
Rogério Beça
 
Texto
Data
Leituras
804
Favoritos
2
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
28 pontos
8
2
2
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
Benjamin Pó
Publicado: 01/03/2022 12:16  Atualizado: 01/03/2022 12:18
Administrador
Usuário desde: 02/10/2021
Localidade:
Mensagens: 589
 Re: Bez Strakhu p/ Rogério Beça
.
Caro Rogério, muito obrigado pela partilha da experiência com o Oleg. É um depoimento mesmo muito comovente. Foi o melhor comentário que poderias ter feito ao meu texto.