Banhando-se sob o sol da estranha tarde, o verde gritante da minha laranjeira me convidava após o meio dia para acomodar-me diante de seu caule, debaixo da folhagem que me livrava daquele sol inconstante que tornava aquela tarde abafada. Observava minha macieira, e como seus frutos, donos de um vermelho-teimoso, fisgavam a atenção de todas as fadas que estavam de passagem para o bosque.
As peônias, manisfestando a delicadeza de suas delgadas pétalas, envergonhava o meu craveiro, que coragem já não tinha, para expor a paixão que apossou-se de seu ser, no primeiro sopro daquela estação. As abelhas em seu pouso, encantadas, adormeceram sobre o néctar do meu jardim solitário de rosa amélia, as rosas, tão delicadas quanto o perfume de uma flor que se abre num jardim esquecido, como o bredo cor carmesim das estufas não mais visitadas do meu quintal.
Feito nuvem puída, um temporal se formou, me despedi daquela divindade prometendo deixar as fontes inacabadas e candentes de impulsos poéticos, tomarem as luzes desse profundo abismo que a minha alma tinha se tornado. As hortênsias, as magnólias e as camélias agregaram um sorriso de elevação atmosférica em minha direção, e acompanhadas do canto das cigarras, as de início de novembro que chegara mais cedo, pétalas foram sopradas aos meus pés, com aquele aroma que me deixava sonolenta.
No dia seguinte, despertei-me com sussuros que pareciam vir do meu harmonioso quintal, era ainda madrugada, levantei-me e caminhei em direção aos murmúrios acompanhada de uma lamparina, uma forte neblina havia tomado posse das copas de algumas árvores frutíferas, a iluminação estava fraca, mas foi suficiente para perceber que o meu jardim de rosas dos sonhos, estava agora, incendiado por demônios.