na minha boca um sem sabor antigo
do mundo antes da tua chegada
antes, as coisas todas bocejavam
na minha alma
hoje conspiram na malha quase arejada
da vida que é também a da gente, bichos e plantas
como que a ganhar força
para escapar às balas do destino
que não deixou de ser mera passagem
agarro essa chama mas tudo é já tão tarde,
porque também eu sou viagem
estranho este cruzar de almas
sem tempo de nos lançarmos os dois
no abismo feliz que nos ampare
– estranho contrato, sim –
nesta partilha de tudo largar
pelo gosto tão raro e próximo
preso às pequenas respirações
quisera não ter corpo já
para aderir sem dor à experiência do sal
e fosse belo desembarcar no mar
a partir de alguma falésia
ah se pudéssemos gravar a eternidade num espelho
de que nos serve a luz,
quando cá dentro há um escuro
de fome nunca saciada,
e a viagem não se faz
sem pão carne e condição.
ah como aprisionar a ilusão?