Que me desculpem todos por este texto, pois sei que este não é o sítio certo para o publicar mas não o consigo calar. Que me perdoem todos os que estão do outro lado do oceano pois não estarão dentro deste contexto muito português. Obrigado
O comentário que não consegui calar
Tenho ouvido nestes últimos dias, chorrilhos de disparates sobre
a questão do momento; o aborto.
No âmbito de um referendo que não deveria existir, tem-se discutido se se é a favor ou contra este mal que é o aborto e se se é contra ou a favor da penalização de quem o pratica. Na realidade, tem servido para dar mais "tempo de antena" a quem pretende sempre mais protagonismo a qualquer custo.
O aborto é uma questão real e incontornável que existe, existiu desde sempre e sempre existirá pelas mais variadas razões. Sendo assim, toda a discussão deveria centrar-se em: "Que condições devem ser criadas para o tornar menos perigoso e traumatizante?". Nenhuma mulher aborta de ânimo leve, porque lhe apetece ou porque acordou mal disposta pois existem sempre consequências reais inerentes ao acto e com repercussões fisicas e psicológicas.
Choca-me portanto que se ponha a discussão sobre a morte de uma vida quando esta pode vir a ser, não uma benção mas um encargo. Alguém que vai ter sempre sobre si o estigma de ser um erro. Há que ter a consciência que o aborto acontece por existirem dificuldades e ultrapassa qualquer lei... é uma questão de consciência individual não um desejo ou capricho! Não me parece, aliás, tenho a certeza que não é com penalizações legais ou exclusões sociais que se resolve a questão.
Reparo que esta discussão, mais uma vez, se divide entre direita e esquerda (ou seja entre interesses e vontades de protagonismo) e é sob esse patrocínio que se condicionam as vidas de quem realmente necessita de ajuda. Quase todas as questões de interesse público são tratadas desta forma... mal educada, desrespeitosa e agressora da inteligência das pessoas. Mas se repararmos, todos nós pagamos para ser tratados desta forma (se nunca reparou nisto, basta assistir às discussões na nossa assembleia da república... e não me venham cá falar da credibilização da classe política!).
É difícil perceber que se ponha o argumento "ética" quando se fala de coisas de resolução necessária e urgente e, pior, que este argumento seja usado por indivíduos que não a têm e fazem uso de qualquer artifício para continuarem no sítio em que estão. Ética desta também eu queria... quando não me convem, aplica-se só aos outros.
Devia haver um pingo de seriedade e discutir-se como adaptar a estrutura existente à necessidade de o aborto ser considerado como um problema de saúde, que é, e não andar em cavalgadas quixotistas a discutir idealismos pouco practicos e penalizadores. Será preferível continuar a fazer estas cirúrgias em talhos e ainda por cima cruxificar em público a megera que se escondeu atrás do pelourinho depois de ser acusada? Ou dar amparo a quem a quem se encontra na contingência de fazer ou fez um aborto por forma a que saiba como evitá-lo ou como se recuperar dele?
Temos então que o primeiro passo é não penalizar quem já o é por lhe ter sido tirada uma parte do corpo, do orgulho e da sua realização pessoal. O segundo passo é a sensibilização de todos para amparar quem é mais vítima do que infractor. O terceiro passo será a criação de uma consciência realmente protectora da vida que passa pelo reconhecimento do direito ao indíviduo, na qualidade de gerador capaz de outra vida com qualidade. Em paralelo, é necessária a criação
de infrastruturas que tornem o acto o menos arriscado possível. E agora digam-me o que é que se anda a discutir? Sejamos sensatos e chegamos facilmente à conclusão que a forma de reduzir o número de abortos e mortes por abortos feitos à facada não é, definitivamente, a marginalização!
Por fim recordo que a esmagadora maioria de quem vai referendar a questão não sabe minimamente o que é um aborto... não sabe nada do que se está a falar e quem deveria esclarecer não o faz! Quem o deveria fazer limita-se a agredir tudo e todos. Paradigmático!!
Sou homem e felizmente nunca saberei o que é fazer um aborto.
MJMS
A boa convivência não é uma questão de tolerância.