Se soubesse escrever melhor os meus pensamentos
Se conseguisse traduzi-los em palavras
Acompanha-los, sem entretanto perdê-los
Escreveria mais e certamente melhores poemas
Injustamente para a realidade do poema
Este conhece-me do todo, apenas a casca rude e dura
Porque o miolo do fruto, rico e nutrido
Fica só para meu proveito.
Só eu posso, em puro ato egoísta, aprecia-lo
Contemplar-lhe a forma, sentir-lhe a textura
Só eu posso imaginar o gosto antes de trazê-lo à boca
Mas, nesta minha realidade, faz-se justiça ao poema
Pois ao preparar-me para comer o fruto e escrever no papel
Deixo caí-lo no chão, perdendo-o irremediavelmente
Para o imenso abismo que separa
O pensamento de qualquer acção
Se soubesse escrever melhor
Se conseguisse acompanhar os meus pensamentos
Traria à realidade do poema
Todo o espanto que deles por mim habita.
Viver é sair para a rua de manhã, aprender a amar e à noite voltar para casa.