Diz-me onde encontro a minha alma,
o onde
é a minha procura,
e
em cada minha
nenhuma é
pura.
Nada tenho,
tudo se me solta,
como posso alma ter?
Mas o que se procura da alma, dessa,
não é o lugar,
não é a sua maneira,
não é a cor,
não é o número de vezes que pensei nela.
Tão só se
em mim existe
ou, sequer, se há.
Tudo,
contudo,
tão
vão.
Dizes-me que é eterna,
dum breu imaculado,
digo
ser só do pensar com que penso,
que morrerá
comigo.
E ao pensar cogito:
se é ter alma ver o bonito,
se é ter algo em que acredito,
se tudo isto não será meu, impressão, mito.
São belas as cores primaveras,
horrores os frios invernos,
estará a alma então
no que sinto
no verão?
a alma de sentir
o frio da indiferença,
o calor do amor,
o áspero no suave da paixão ao ódio.
o sabor a sal, do cloreto de sódio,
estará na alma do sentimento?
no arrepio do vento?
Estará a alma em algo disto,
nesta rima calma com que me am'algo e conquisto?
Sim, Claro que não!
toda a alma é um clarão
de credo.
Convenço-me
que, no interstício celular,
no RNA mensageiro,
no ciclo de Krebs, na mitose
há uma dose de poesia,
de razão benta
presa, aos fevereiros dos anos bissextos...
coisas seculares
sem espíritos,
sem deus,
sem deuses, nem Hades.
Diz-me
onde encontro a minha alma,
não a perdi,
estará por aqui?
Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.
Eugénio de Andrade
Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.
Nota: abriu na minha rua recentemente uma loja de artigos usados e antiguidades que me tem levado aos tempos de infância, rio-me só de ver a montra.
Magazin descobri recentemente que é Loja em romeno.
Coisas da alma