A sua pele não sentia uma única ruga, como se os anos se esquecessem de o importunar com as agruras da idade e ele abusava desse magnífico atributo, sabia usar o charme falso que tinha trazido da vida anterior, sabia ser sedutor, até, por vezes, cavalheiro, mas tudo isso seriam estratégias que usava para contornar quaisquer problemas que pudessem surgir, a vida é feita de surpresas e essas não calham apenas aos outros. Uma obra de Lúcifer, dissera-lhe certo dia um padre ortodoxo, nem gente nem bicho, chamara-lhe Baʿal Berith.
A única coisa que o acalmava, nos momentos de solidão que aproveitava da noite, era recordar a menina que o acompanhara durante a infância e com quem esteve perto de casar, de olhos claros, cinzentos, e cabelo negro como a própria noite. Uma ténue luz de esperança lhe que permaneceu no corpo.
Todos as noites, insuspeito, passava junto do portão da mansão onde nascera, sozinho praguejava como no dia em que fora forçado a sair, já tinham passado cinco anos sobre esse fatídico dia. O ódio era o mesmo e um certo desejo de vingança ocupava-lhe boa parte dos pensamentos naquelas momentos em que se agarrava às grades altas que limitavam o jardim, como se as quisesse arrancar à força de braços. Numa dessas noites pareceu-lhe ver o irmão do seu pai e os seus irmãos a degustar finos charutos e a gargalhar, a raiva fê-lo chorar, não conseguira evitar aquele momento de fraqueza.
A Poesia é o Bálsamo Harmonioso da Alma