VIRA E MEXE
Noite sim; outra também,
Vou para cama sem sono...
A Morfeu eu me abandono,
Mas tarda e ele não vem.
Como se ausente patrono
A desdenhar-me a morada...
Vira e mexe me acontece
De apesar de toda prece
A alma varar madrugada
Enquanto o corpo padece.
D'olhos fechados na cama,
Olho p'ra dentro de mim
Na esperança que assim
Eu ponha fim ao meu drama.
Sem embargo, tenho enfim
O escuro d'onde absorto,
Sem espíritos ou deuses,
Quedo a lavrar enfiteuses
Como se estivesse morto
Antes mesmo dos adeuses...
Se nem as assombrações,
Os anjos nem os demônios
Vêm velar por meus neurônios
Em face de seus senões,
Tampouco doutores idôneos
Hão-de dar fé dos meus ais
Silentes na noite escura:
Nada ou ninguém me figura
Quando por horas demais
Descanso meu ser procura...
Viro-me de lado a lado;
Mexo-me sem quê p'ra quê.
A noite toda à mercê
De permanecer deitado
Ainda que sem porquê.
Vira e mexe viro e mexo
Sem que consiga dormir
N'um presente sem porvir.
Desperto assim, por desfecho,
M'esqueça até d'existir...
Betim - 25 09 2019
Ubi caritas est vera
Deus ibi est.