Num campo de milho no Minho
pouco maior que um hectare,
em mangas de camisa
vive um espantalho.
Preso ao seu trabalho,
avisa,
sem hesitar,
o voar do estorninho.
O tom claro ao vento,
a posição do chapéu de palha,
a leve inclinação das espigas
traz, às arrecuas, o bando
que, voando,
começa em cantigas
e pelo campo se espalha
com a fome em talento.
Às aves que hesitam, com medo,
diz o espantalho contente:
nem sabem da vossa sorte
(entre outras, que se poisam nos braços)!
Pergunta-se a seara a espaços
se bico, se boca, é a morte
presente,
apenas ignoto, não há segredo.
Roda a terra em mais um Sol, rei
posto e nado;
e agosto parece enganado, treme…
De fio a pavio, o espantalho sem nome,
sem fome
ao leme
dum navio encalhado num prado,
respeita o seu fado, a sua lei…
Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.
Eugénio de Andrade
Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.