Tudo que se pode chamar de ternura, ficou no passado
Sob um céu de vinho tinto cor de veludo na noite turva
Ah, é tudo tão longe! É uma estrada só de acumular pó
Sobre minha história de ave de arribação mal explicada
Pela insônia tresnoitada dos pedaços de vida não vivida
A aurora rescende a rostos cheirando água de colônia
Lembrança de tantas ausências, de minutos esquecidos
A taça com um resto de vinho permanece no aparador
Simbolizando tudo aquilo que poderia ser e se esqueceu
Ou que a dor antiga confundiu fazendo não mais desejar
Onde foram os sonhos em que deitamos nossa esperança
Quais desvios que aceitamos no caminho sem o perceber
Sob quantas camadas secretas que se oculta a felicidade
Haverá alguma promessa que um dia se fará para cumprir
Um dia deixaremos de dizer coisas que podem machucar?
Saiba que depositei minha franca confiança no que dizias
Foram só mentiras que usaste apenas para me afastar
Porém nós sabemos que mentir trará um preço a ser pago
E eu devo te contar que esse preço é sempre alto demais
Queria te fazer feliz e fostes escravizada pela solidão
Sou poeta e todo poeta pode ter algo de triste, mas nunca infeliz
Morre-se à noite, se renasce na intransferível dimensão da manhã