Das coisas que ocorrem em dias cinzas, numa segunda de dolorosos mistérios...
Era sol e há muito que não se encontravam dessa maneira. Sempre evitaram encontros, ela principalmente. Entreolharam-se.
Nuvens se fizeram presentes e a ameaça súbita de chuva veio em forma de lágrimas.
E já não era o mesmo olhar de outrora, ela observou. Mesmo evitando o olho no olho, sentiam quando o olhar um do outro deitava-se e se deixava permanecer ali, percorrendo as mudanças, à princípio sutis, um do outro. Sem cumprimentos casuais ou efusivos. Somente um boa tarde, sem toque, sem emoção. Houve silêncio.
Chegou o mistério gozoso de uma terça-feira e as preces de todos os anjos deram continuidade.
Ah, a moça! Ela não era de esperar, detestava esperas. Só aguardava algo se houvesse um belo tesouro no fim do arco-íris. Então, de súbito, resolveu desatar os nós como numa oração. Solicitou a libertação.
Nada mais justo iniciar o discurso de si mesma, pensou. Lembrou da insônia atravessando a madrugada, do medo antecipado, o desespero sobre o inesperado... Mas naquele momento, aquele determinado momento, não sentiu-se desconfortável como no dia anterior.
Algo mudou, ela pensou.
Então desabafou todas as dores, os medos e até as mágoas do passado que ainda faziam chagas em seu coração. Esvaziou-se da tristeza que a incomodava, desaguou nele as expectativas frustradas. Sem acusá-lo, mas denotando os erros que ele necessitava enxergar. Talvez ele enxergasse. Talvez, lá no fundo, sabia-se errado, mas nunca iria admitir.
"-Eu fui tudo: início, namorada, noiva, mulher, amante, fim. Tudo e nada. Não quero ser um caso. Vê, mereço mais que isso..." Não era cobrança, era conclusão.
Ele refletia em silêncio, sem interrupções. Apenas analisando tudo que a moça falava. Ouviu pacientemente as cruzes carregadas, a entrega, o não-recíproco.
Então houve a redenção, o mistério das glórias alcançadas. Um abraço acolhedor, mas o toque tornou-se em prática do braille corporal. Ela não imaginava, mas estava se despedindo. Se permitiu ao último adeus.
Sentiu, algo havia mudado nela não importando se ele havia mudado ou não. Ela não sentia que ele a entendia, nunca a compreendeu, apenas a sentia, apenas a queria, só. Imaginou mais dele, mas sabia que a coragem era algo que à ele não pertencia. Ela queria mais, sempre queria, gostava de transbordar! Enfim... já não importava mais o passado, o presente, o futuro ou ele, ela queria viver. Terminou o que ele não tinha coragem de finalizar e despediu-se. Sentia-se cansada. Porém, havia paz.
Rooziee Oliver 2017, 28 de Janeiro