Pergunto-me se no feitio
está aquilo de que sou feito.
Lá para dentro espreito
vejo, cego, molduras e vazio.
Desse barro sujo desconfio,
janela sem parapeito
em que me deito,
muitas vezes, com frio.
Questão eterna que adio,
talvez até ao último leito,
a resposta nunca aceito,
procuro-a na foz de cada rio.
Pergunto-me se, por atavio,
ou profunda falta de respeito,
é este feitio apenas um jeito,
ou meu navegar, meu navio...
Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.
Eugénio de Andrade
Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.