Eu vi, juro que vi,
vindo num rompante,
abrindo a mata,
fazendo ventania,
subterfúgio;
coisa de bicho do mato
para aparecer.
Veio surgindo às risadas,
saindo do fundo do poema...
- Ouçam!...
É um menino de metro,
pretinho, azeviche...
Parece uma imagem,
ou miragem. Sei lá!
Pé no chão
e cabelo pixaim.
Corpo sarnento,
nariz com meleca,
chulé fedorento,
`zóinhos` remelentos,
falando pelos cotovelos...
Falava ininterruptamente
palavras estranhas,
desconexas,
tacanhas,
sem rela nem trela.
Iam assim; saindo,
uma atrás da outra
daquela pequena gamela.
Nem o pito aceso,
no canto dela caído,
fazia-o trancar a tramela.
Opa! Num pinote e rodopio só,
sumiu num rodamoinho.
Só vi o gorro vermelho
pendurado no canto da tela.
- Moleque safado!
- Passa fora daqui!
Anastácia em gritaria.
- Sai moleque!...
- Sai filhote de cruz credo!
Ouviu-se de novo o sorrisinho.
Só dava pra ver os dedinhos
saindo detrás do paspartur.
Correu, pulou,
deu a volta na moldura,
a traquina criatura.
Furou o bolo de fubá
o biscoito de araruta comeu,
e lambeu toda a rapadura.
- Meu Deus, quanta travessura!
Deu outra risada,
pitou o cachimbo de barro,
cerrou a cortina da cozinha...
E assim;
sem eira nem beira,
saiu do poema em correria
no meio de baita poeira,
só pra ninguém mais o ver.
Ah! Pererê...
Pronto!
De bucho cheio;
foi dormiu e fazer dormir quem não dormia.
Pudera!
Num colchão fofo de poesia!
Saci-Pererê, um dos personagens mais conhecidos do folclore brasileiro. Possuí até um dia em sua homenagem: 31 de outubro. Diz a lenda que ele transformou-se de um jovem negro com apenas uma perna, de acordo com o mito, havia perdido a outra numa luta de capoeira. Passou a ser representado usando um gorro vermelho e um cachimbo, típico da cultura africana. Quem primeiro retratou o personagem, de forma brilhante na literatura infantil, foi o escritor Monteiro Lobato, nas histórias do Sítio do Pica-Pau Amarelo. E Tia Anastácia, é quem sofria mais com as travessuras dele.