Poemas : 

a ausência

 







A janela converte-se em espelho.
No tardar de ser, vem a certeza.
Por entre o frio do tacto e o olhar quebrado.
O céu vertendo a embriaguez.
A árvore reclina-se medindo o tempo.

Vem contida no sangue, a ausência.
Vem, como tarde cega que procura
a cadência da papoila entre o trigo.

Em lamento, o coração ondeia,
efémero e maduro.
Conta o tempo. Estima o instante.
Como asa que espera o vento.

Mas o corpo permanece.
Sobre os ombros de si próprio.
Na travessia, compõe a presença.
Em afirmação de partida.










Zita Viegas















 
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atizviegas68
 
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Enviado por Tópico
Gyl
Publicado: 02/12/2018 10:20  Atualizado: 15/12/2018 11:22
Usuário desde: 07/08/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 16148
 Re: a ausência
Texto ímpar com todas as características genuínas que a diferencia da turba e da arraia miúda. Como gosto! Abraços que cheguem à linda ilha!


Enviado por Tópico
Volena
Publicado: 02/12/2018 16:03  Atualizado: 02/12/2018 16:03
Colaborador
Usuário desde: 10/10/2012
Localidade:
Mensagens: 12485
 Re: a ausência P/ atizviegas68
Um poema magnífico, adorei, beijinho Vó


Enviado por Tópico
nereida
Publicado: 12/12/2018 11:34  Atualizado: 12/12/2018 11:34
Membro de honra
Usuário desde: 27/08/2017
Localidade: São Paulo
Mensagens: 2285
 Re: a ausência
Muito lindo! Gostei deveras.
Abraço carinhoso

Enviado por Tópico
Rogério Beça
Publicado: 15/12/2018 11:19  Atualizado: 15/12/2018 11:19
Usuário desde: 06/11/2007
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Mensagens: 2123
 Re: a ausência
O poema começa muito bem logo com o primeiro verso. Ele ordenou-me o comentário.
“A janela converte-se em espelho”. Gosto do tempo verbal. O presente do indicativo, neste caso, soa-me mais a gerúndio, que li algures poder ser chamado de presente perfeito.
No verso podemos ler com facilidade, num sentido metafórico quase directo, que há um tempo para observar e outro para refletir. A conversão delimita essa consequência. Não é o espelho que se converte em janela.
Surge também que na lei da vida (generalizando) a aprendizagem faz-se em primeiro lugar pela observação do que nos rodeia. A janela é precisamente essa expressão do olhar.
Mas, essa mesma aprendizagem, da relação com o mundo, com os outros, e do vazio, acontece com o pensamento, com o auto-conhecimento, num estado de amadurecimento.
E daí “…No tardar do ser vem a certeza…” continuas. E muito bem.
Contudo a personagem principal deste poema é a “ausência”, contida sim no sangue, no sol, no tempo, nas sombras que nos permitem achá-lo, medi-lo.
A ausência é uma definição, ou limite, necessária. Embora seja uma lacuna por sinónimo, ela preenche as nossas lacunas e dá sentido às nossas frases, permite os pensamentos, alimenta o espelho.
Havendo ausência no sangue e o coração ondeando, parece que surge uma relação com o lamento, com o tempo que foge e que há que dar-lhe o devido valor, não o ocupando à toa.
No fim, segundo o que acredito, todos seremos ausência. E depois de nós tudo será ausência, no fim das janelas e dos espelhos.
Acho que foi isso que li na última estrofe. Dessa inevitabilidade agridoce que nos compõe o dia-a-dia.

A procura de metáforas invulgares foi muito bem conseguida. A comparação, na segunda estrofe, que quer salientar o contraste, também.
Obrigado, mais uma vez, por trazeres literatura a este espaço.


Enviado por Tópico
ZeSilveiraDoBrasil
Publicado: 17/12/2018 10:57  Atualizado: 17/12/2018 10:58
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Localidade: RIO - Brasil
Mensagens: 2215
 Re: a ausência
coube na minha leitura, expressão semelhante à:"...na lei da vida (generalizando) a aprendizagem faz-se em primeiro lugar pela observação do que nos rodeia."
extraí do fecundo comentário do Rogério Beça.

o olhar do poeta é a janela para o tempo; e a poeta foi abrangente nesse texto. congratulações.


um abraço caRIOca