Nestas noites tropicais tenho que ir à varanda. Os grilos cantam a sinfonia deste final de verão, enquanto os pernilongos desafinam. Algumas estrelas lançam seu jorro do infinito enquanto uma tênue brisa vinda do rio Paraíba nos visita e alivia o calor.
E da varanda fico assistindo a partida de futebol no campo de areia diante do meu prédio. A moçada joga com vontade, alguns levam a sério demais. Eles arriscam uma torção do tornozelo, a fratura da tíbia, luxação do perônio. Ninguém é de ferro e ninguém é profissional.
Talvez faça parte da fantasia masculina. Ainda um brinquedo de meninos, em substituição aos cavalos de pau, espadas e capas com a toalha de banho. Heroísmos que povoaram a mente desde a infância.
Quantos jogadores frustrados ali no campo! Eu mesmo, mero espectador, sou um deles. Gostaria de ter sido um Leivinha, craque do Palmeiras na década de 70, ou ter a cadência de um Ademir da Guia, regente da Academia.
Sonhos perdidos ainda presentes no inconsciente. Ser um astro: jogador de futebol ou cantor de rock. Semelhanças entre si: as luzes e a plateia.
Mas a moçada ali no campo não convive com a fama, nem com o estrelato. Todos têm vidas comuns e cumprem as suas rotinas nos escritórios e nas fábricas.
E reparo o senhor meio calvo e de barba, barriga supérflua e de pernas finas que se destaca dos demais jogadores. E se destaca porque os outros são razoáveis como amadores. Mas, ele não mostra qualquer destreza com a esfera. Corre como se tivesse as duas pernas amarradas. Não tem vergonha de dar vexame.
Acho que a vida é assim mesmo. Tenho que repetir um antigo clichê: aqueles que estão na média, passam despercebidos, enquanto que os gênios e os loucos deixam o seu registro na história.
E ele se desloca de um lado para o outro, livre de marcação. Mas os companheiros não passam a bola.
Quando a bola sobra após uma dividida, o chute sai enviesado e torto. Depois leva um drible desconcertante. Alguém solta do alambrado o velho grito das touradas de Madri: - Olé!
- Vamos pegar na marcação! – grita como se fosse o capitão do time.
- Volta! – dá o comando.
O companheiro erra o passe.
- Valeu! – mantém o incentivo.
No meu julgamento implacável de observador de sacada, pergunto que se ele não fosse tão ruim de bola, seria solidário com os companheiros como demonstra ser?
E faço suposições sobre a sua vida profissional e o que faz pra ganhar a vida. Deve vestir terno e gravata nestes dias quentes e visitar os clientes tentando vender um produto da firma. Pode também trabalhar num escritório fazendo balancetes contábeis. Ou ainda, ser o responsável pelas devoluções de mercadorias e escutar as reclamações dos clientes de um supermercado.
Seja lá qual for a sua profissão, deve exercê-la com presteza. Atura tudo, todas as chateações, porque à noite tem a recompensa. Na imaginação sempre acontece um grande clássico. Mesmo que seja um perna de pau, joga com muito prazer e alma as suas peladas no campinho de futebol de areia.
Luiz Felipe Rezende