O chicote nunca entenderá a mão...
Conhecia bem as costas,
a pele magra,
a viscosidade do sangue escuro.
Tinha um certo dó da monja.
Figura alta, complexa, na pressa de absolvição.
Ainda assim, nos t(r)emores que tinha,
nunca ouvia um suspiro,
sequer.
Apenas o silvo.
Também o vento lhe cortava o descanso.
A culpa, que lhes atravessava,
era
matemáticas das dúvidas
[será que ainda adoro?
serei séria ou fingida?
a cambraia, que agora coloro,
é, em sangue, tingida!].
Arranhava da mente fraca o desconsolo
que fazia, do chicote, presente
e a si mesma
igual.
Fazia das fraquezas, força.
Um regalo para todo o credo.
Entre elemento de vício que brote
e a devoção,
viviam o chicote
e a mão.
Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.
Eugénio de Andrade
Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.
Reedição com pequenas alterações em 27\05\2024.