O LIVRO INVISÍVEL DE MINHA MÃE
A cada dia tem algo que me lembra você, seja em qualquer coisinha pequena, um calendário da Seicho-No-Ie, ou seu caderninho de receitas.
Tenho um caderno de receitas que você me deu quando casei, e na primeira pagina você colocou: “Receita de Feijão”… Ai você escreveu direitinho como se fazia feijão Então, de repente eu lembrei um dia, você na cozinha, e você chegou bem perto de mim e falou baixinho: “ninguém sabe do meu segredo, mas eu coloco uma colherzinha de maisena no caldo do feijão para engrossar”… E você nem escreveu essa dica no caderno…(risos).
Somente alguém pode entender o verdadeiro valor de uma mãe quando a perde. Enquanto ela esta viva, as lembranças estão ali com ela. Mas quando ela morre, parece que as lembranças começam a florescer, e começamos a entender tantas coisas que não entendíamos… A mãe deixa um legado de vida, que a cada ano eh mais e mais entendido Eh como se ela tivesse escrito indiretamente um livro diário de ensinamentos através de suas atitudes, de seu carinho, desprendimento, amor, e de repente nos vemos virando as paginas invisíveis desse livro, a cada dia que passa.
Alias, parece mais um livro de receitas. A receita de viver, de entender, de aceitar.
E quando temos um filho, eh maior ainda o entendimento do amor de uma mãe, e começamos a perceber tudo aquilo que nossa mãe fez por nos.
Você mãe, era assim: A gente podia estar de qualquer jeito, com qualquer cara, e você dizia assim: “Como você esta linda!”. Sempre estava a levantar nossa moral, fazendo com que a gente se sentisse tão gente!
Um dia desci a escada de casa vestindo um maio. Então você olhou para mim e disse: “Nossa, que corpo lindo!”. Aquela época eu era gordinha… e você me achava o máximo…mãe!
Somente uma mãe nos acha o máximo, entende nossos medos, não leva a mal o que falamos, lê os pensamentos…
Assim era você mãe, procurando sempre uma formula magica para nos fazer felizes. Que fosse no seu feijãozinho temperado, no arroz branquinho, naquele xuxu com molho branco, na torta de frango, no pudim de leite condensado, ou no manjar branco Ou sentada no sofá, fazendo a barra de nossas calcas jeans…
Levantando de seu soninho da tarde, com aquele penhoarzinho cheio de botões na frente, cheirando a leite de colonia. Sentava para tomar café meio sonada, com aquele seu sorriso meio desmaiado de sono.
Ainda me lembro de voce no espelho, colocando seus cremes, o pó de arroz da Cashmere Bouquet (a cor era Rachel), e aqueles batons vermelhos, que ficava tentando acertar o contorno de sua boca. Depois, o colarzinho, sempre o colarzinho e o brinquinho, extremamente feminina. O perfume “Charlie”… O creme de limpeza da Ponds.
No calor você sempre gostava de calca branca, que colocava com suas blusinhas estampadas. Sandálias abertas, sempre mostrando seu pé tão bem feito.
Você era o símbolo da feminilidade, mãe!
Que saudade sinto de você nesse momento. Uma saudade física, de lhe dar um abraço muito apertado, de sentir seu cheiro, de ouvir seu riso. De olhar para seu rosto e ver aquele seu olhar extremamente bondoso. De entrar em casa e vê-la tricotando no sofá, aqueles lindos paletó zinhos de tricô, cheios de lacinhos e rococós Eu adorava ir com você no Bazar Estrela comprar rococós, e lacinhos… como eu curtia!
Depois de ver suas criações… de todas as cores. Quanto capricho. E quantos pensamentos iam juntos com aqueles casaquinhos… pensamentos que você tinha enquanto tricotava.
Que vontade tenho hoje de vê-la andando no jardim aparando suas rosas, e conversando com elas. Cuidando de seus antúrios no nosso terraço
Daquela bala de coco que você fazia e eu ficava na cozinha um tampão puxando-a com você…
Das suas mãos carinhosas, dos seus passinhos miúdos...
Sua inocência formou um foco de luz em minha saudade.
Seu riso alegre, alto, esta na minha memoria estampado.
Seu rosto suave. Terno. Sua beleza espiritual.
Hoje mãe, eu queria dizer especialmente que te amo. Te amo de verdade mesmo, com todo meu coração e alma.
Esse mesmo sentimento me toma, todas as vezes que abro seu livro invisível Nele eu enxergo sua bondade, tenho o exemplo de sua paciência, e muitas palavras que você me disse que nele ficaram gravadas.
Orgulho-me de ter vindo de seu ventre. De ter sido embalada pela sua alma e pelo seu amor.
Obrigada por ter me gerado, e me dado vida.
E por ter me deixado esse livro invisível que esta bem guardado no armário do meu coração.
*Mary Fioratti*