NOSTALGIA
Onde está aquele olor inebriante
que tornava a emoção tão comestível
como as pétalas de uma rosa branca?
Onde estão aquelas notas
que de tão harmoniosas
geravam rios de lágrimas e arco-íris inversos?
Onde está aquela luz
que emanava dos nossos corpos
despertando as estrelas,
tornando nossas noites muito mais iluminadas?
Onde se escondeu o beijo
que não aconteceu
e tornou mágica a manhã de abril?
Em alguma esquina,
na ponta de um iceberg,
no topo de um mastro,
nas brumas de um sonho
alguém encontrará o nosso cheiro.
E por ele se guiará ao paraíso,
pois diante de nossos olhos desfilam os mortos,
enquanto os vivos vagueiam
na neblina de sua existência medíocre.
Eles voltam para refazer a sua história
que alguém não registrou como devia
ou morreu antes de escrevê-la.
Nas ruas se erguem paliçadas
para barrar o inevitável,
enquanto os mísseis cruzam o ar
e o homem da caneta de ouro distribui migalhas.
Onde está o violão
que fumegava tarântulas assustadoras
sobre a mesa do homem nu?
Onde estão os guardanapos
sobre os quais os poetas escreviam as suas profecias
embriagados de cerveja e sexo?
No tempo que se fez de chumbo
ergueram-se as baionetas
e amordaçaram o espantalho que vigiava o campo.
E veio a noite e veio o dia
as aves do céu devoraram o fígado do espantalho
enquanto Quírom dormia sob as marquises dos velhos pardieiros.
O que fizeram dos corrimãos de sonhos dourados?
o que fizeram dos caracóis alados?
Cadê o meu cavalo de pau?
As ruas estão desertas
ou repletas de homens vazios
embora conduzam o mundo nas mãos.