BAGAGEM
Carrego comigo
Um coração de carne.
Que também vira pedra.
Um relógio na mente.
Sem marcar hora.
Uma chave e cadeado.
Que me abre por dentro.
Levo a lua como lençol.
Levo lembranças de um sol.
Levo estrelas cadentes.
Como eu.
Um riso louco e triste.
Levo juízo de quem sente.
Uma música gravada.
Na memória dos meus dias.
Sonhados.
Minha eterna companhia.
Não levo passado.
Que me preteriu no presente.
Só o pó da estrada.
Vai comigo.
E pequenos grandes gestos
De certos amigos.
Deixo pra trás o Amor.
Não vale mais a pema.
Já contempla outros ares.
Desmaia em outros altares.
Não não me devota louvor.
Desisto. Sigo enfrente.
Mas não levo dor.
Levo a indiferença comigo.
Pra me servir de lição.
Atenção anda em falta.
Nesse nosso mundo cão.
Dei férias ao sorriso.
E também ao olhar.
Levo minha mantinha.
Única companheira.
Se eu chorar.
Nessa hora derradeira.
Sim, eu vou chorar.
Vou usar o lenço.
Não. Uso o lençol.
Para conter um rio.
Sentarei no coração de pedra.
Nas durezas da vida.
No final da estrada,
Jogarei no chão o lençol.
Enxarcado.
Na noite escura.
Deitarei com as estrelas cadentes,
Como eu.
O céu estará dentro de mim.
É o começo do fim.
Mas antes realizo um sonho
Ver a Lua e o Sol se amar.
Com amor e desejos.
Sem lembrar do tempo
Da desilução.
Do desprezo.
De uma notável discrimiação.
Num último instante,
Quero sonhar.
Terei seu sorriso e olhar.
Pela última vez, nesse instante.
Mas já não será o bastante.
Pra me fazer voltar.
E perdendo o juizo.
Entregarei a ti.
A chave e o cadeado.
Que me abrem por dentro.
Com a nossa música a tocar.
Será sua última chance.
De me vasculhar.
Ver todos meus sentimentos.
Me amar ou partir.
Eu não vou insistir...
Muito tempo ja perdi.
Muito sofri.
Se a senha lembrar.
Você vai me abrir.
E então verás.
O valor que tem o amor.
E vai chorar
Ao lembrar o tempo que perdeu.
E passou.
Se eu um dia voltarei,
Não sei...
Talvez, também, pó ja serei.
" Eu te dei meu amor e te dei valor.
Sem saber porque te perdi.
Mudastes a direção do teu olhar.
Navegas, hoje, novos mares.
Olhares.
Tudo passou.
Só restou a saudade.
A vontade.
Do beijo que não te dei.
Assim também, passei.
Vera Salviano