LEMBRANÇAS DA ROÇA
( Córrego Santa Fé )
Hoje, arribei da cama mais cedo.
Antes do galo cantá.
Fiz cum fé minha oração.
Passei barro branco no fugão.
O que sobrô. Passei no chão.
Inté que o barro secava.
Fui na porta da cuzinha.
E rachei uns pau de lenha.
Juntei também uns graveto.
Pus fogo no meu fugão.
Que confusão.
Faltava açúcar pro café.
Ceis sabe cumé quié.
Lembrei que tinha rapadura.
Que gostosura.
Cum ela adocei o café.
Fatiei angú durmido.
E pus logo pra fritá.
Angu frito com café de rapadura.
Minha fome fui matá.
Peguei a paia .
E o fumo disfiei.
Enrrolei paia com fumo.
Fiz o meu pito e pitei.
No quintal, na bera da cerca.
Panhei muito lobrobô.
De novo eu fiz angu.
Isquentei o arrois.
Afoguei feijão com aio.
E fiz também um chuchu.
Outra veiz, fiz boca de pito.
Da porta espantei o cabrito.
Nessa hora, as galinha cantô.
Fui pegá os ovo que botô.
Fui na bica, peguei água.
E pus dentro da gamela.
Lavei pratos e tirrinas.
E pus pra secá na janela.
O sol já tava meiano.
Marcano o meio dia.
Lavei a ropa na bica.
Turci e pus na bacia.
Esperei o sol abaixá.
E na cerca puis pra secá.
Fui no mato e cortei vassora.
No cabo amarrei intão.
Despois de varrê a casa.
Fui no quintale. Peguei mamão.
Fiz doce de mamão ralado.
Pra cumê com quejo curado.
Na trempe isquentei café.
E fui meu fumo enrrolá.
Pra mode podê pitá.
O sole já iscundia.
A lua no céu paricia.
A vida na roça só é boua.
Se os zome tem sua patroua.
A noite chegô mais cedo.
Fomo logo lavá os pé.
Acendemo a lamparina.
E rezamo com muita fé.
No cangote fizemo cafuné.
Fiquemo de cabelo im pé.
Amanhã é novo dia.
Deus vai nos abençoá.
Vai dá nóis vida e saúde.
Pramode podê trabaiá.
Visita da cidade é prazê.
Quando vem e trais o pão.
A gente mata um franguin.
E comi com macarrão.
"Vida na roça parece fáci.
Mais num é tão fáci não.
Veiz ou otra come um franguin.
Nas otra, arrois.
Verdura e fejão."
♡ Vera Salviano ♡
Vera Salviano