Ao Homem comum não deve ser possibilitado a visão do invisível. Ao louco, não devem mostrar o impossível, esse irmão do poder.
Facilmente, onde havia Quimeras, haverá um cão vadio e pulguento (às manchas, ainda por cima). As Esfinges, enigmáticas e inquisitivas, darão ares de gata rouca e medrosa, em tons siamesa, do sol de verão fábil e ventoso.
Se o homem comum for louco, e se as alucinações que tem forem controladas com mantras e beliscões no ante-braço direito, o mais acertado, é o rabo de cobra da Quimera falar com a asa direita da Esfinge e começarem um palavrar incomum.
- Prazer em conhecer-me! Como me chamo?
Diz a que estragula.
Silvando da cauda. Ruge.
- Diz-me tu! Muito gosto em olhar nos olhos teus que, derrapinos, me despem, ainda que nú ande...
Incapaz de disfarçar a enorme atracção que lhe sente.
A Esfinge espera a resposta.
A Quimera sabe que já respondeu.
Segue a segunda tagarelando, sobre as porções de infinito que existem num fotão à velocidade da luz.
A Esfinge resolve ser paciente num sorriso. Afinal não é todos os dias que vem ter consigo um gajo metade leão, metade cabra, e cauda com pouco veneno.
O leão em si ronrona, descompassadamente.
Um cão a enroscar-se numa gata!
(pensa um transeunte esfregando os olhos e a pegar com a terceira mão no smartphone, para mandar para o ioutubas).
Nisto, o homem louco pensa:
Pronto! É agora que a Esfinge vai estrangular a Quimera! Ela enganou-se na resposta!
A gata lambe-lhe o focinho e diz-lhe num miado rouco e pausado:
- Até amanhã...
Sou fiel ao ardor,
amo esta espécie de verão
que de longe me vem morrer às mãos
e juro que ao fazer da palavra
morada do silêncio
não há outra razão.
Eugénio de Andrade
Saibam que agradeço todos os comentários.
Por regra, não respondo.