Quando eu era criança
minhas gavetas
eram recheadas
de bonecos de ação
e carrinhos em miniatura.
As manhãs eram ensolaradas,
eu me sentava na sala,
desenhos passavam na tevê
enquanto eu criava
diversos filmes de ação
com meus bonecos,
o ar tinha cheiro de saliva,
eu cuspia para todos os lados
fazendo os efeitos sonoros
e usava uma caneta vermelha
para fazer o sangue.
Quando eu voltava da escola
tomava um banho
vestia meu pijama,
tudo era tão confortável,
jantava e voltava para meus filmes
só que durante a noite
eles aconteciam em meu quarto,
eu respirava esperança
sem preocupações
ou maldade.
Hoje minhas gavetas estão vazias
ou com apenas alguns fones de ouvidos
e carregadores de celular,
minhas noites são vazias
minhas manhãs são vazias,
não vejo os raios de sol
como antes,
acordo por volta de meio dia
durmo por volta das três da madrugada,
os filmes que antes eu criava enquanto brincava
hoje são criados quando tento dormir,
não são mais de ação
são de terror.
A esperança encontra-se a setenta e sete
palmos,
abraçado a maldade
me deito
ainda não consigo me preocupar com nada
nem sentir muita coisa,
não uso mais pijama
e o ar me cheira
a flores mortas
bêbados
canivetes
paranoia
e angustia.